‘Tudo aconteceu mais rápido’, diz especialista sobre enchente de 2024 em comparação com tragédia de 1941

Porto Alegre passa por nova tragédia semelhante a de 1941
Porto Alegre passa por nova tragédia semelhante a de 1941 — Foto: Arquivo/O Globo

A enchente que impacta o Rio Grande do Sul, com a cidade de Porto Alegre no epicentro, já superou os registros da tragédia vivida em 1941, quando a capital também sofreu com as cheias do lago Guaíba. Na época, o nível chegou a 4,76 m, o equivalente a 59 centímetros abaixo do atual desastre, e levou 32 dias para que retornasse ao limite seguro de 3 metros. Enquanto em 2024, ainda não há previsão para a normalização da situação na capital gaúcha, o professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da UFRGS, Fernando Dornelles, aposta que o período será mais prolongado do que o enfrentado há 83 anos.

— Olhando esse número de 32 dias, eu apostaria, porque não tem como cravar, principalmente devido às chuvas previstas e aos ventos, que vamos superá-lo. É um pensamento empírico, mas tivemos a concentração mais veloz da água da chuva dessa vez, com acumulados de 500 a 700 milímetros, em pouco mais de uma semana. Em 1941, quando choveu por 35 dias, tivemos um valor de 900 milímetros, foi mais espaçado — detalhou ao GLOBO.

O também professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da UFRGS, Rodrigo Paiva, concordou que ainda não é possível apresentar uma expectativa de escoamento das águas em Porto Alegre, e também acredita que uma das causas da gravidade do evento climático foi a rapidez.

— A principal diferença é que nessa enchente de 2024 tudo aconteceu mais rápido, muito mesmo. Escalou de uma forma surreal. O nível foi superior bem superior a de 1941, mais de 50 centímetros. Antigamente tinha menos população, ainda não haviam ocupado áreas de risco como hoje— ressaltou ele.

Também é possível ver o maior impacto da catástrofe não só na estrutura, mas em símbolos da cidade. No Mercado Público de Porto Alegre, há uma placa que registra a marca da enchente de 1941 e indica a altura que a água atingiu em 8 de maio daquele ano. A chapa de metal está submersa desde domingo (5), quando o Guaíba chegou a 5,35 metros.

Há 83 anos, quando a capital do RS enfrentava a crise instalada pela água, os bondes que cortavam toda a cidade pararam de funcionar, assim como a Companhia Força e Luz, que fornecia eletricidade para população. O mesmo aconteceu com as escolas, que tiveram todas as aulas suspensas na época, e a cidade se viu em um estado de terra arrasada. Cerca de 70 mil pessoas, o equivalente a 25% da população, que era de 270 mil, ficou desabrigada.

Em 2024, o cenário se repete e, segundo a Defesa Civil do Rio Grande do Sul, 790 escolas foram afetadas de alguma forma, seja por serem danificadas, por problema de acesso ou até mesmo por estarem servindo de abrigo para a população atingida. Ao todo, 273.155 estudantes foram impactados em 216 municípios. Pelo menos 138 mil pessoas estão sem luz e com pouca água para beber em Porto Alegre e, até o momento, três pessoas morreram devido às enchentes. Não há mortes registradas na tragédia de 1941.

Das cinco estações de tratamento que estavam paradas na cidade, três voltaram a funcionar na terça (7). Outras duas seguem sem operar já que as bombas responsáveis por captar a água do Guaíba estão inundadas.

Na época da tragédia de 1941, as chuvas no Rio Grande do Sul começaram em 10 de abril e se prologaram por 35 dias, sendo 22 apenas em Porto Alegre. Desta vez, a chuva no estado começou no dia 29 do mesmo mês e já chegam ao nono dia, ainda sem perspectiva de término, já que a previsão do tempo indica que as chuvas devem retornar a Porto Alegre pelos próximos cinco dias, até domingo (12), e podem somar 125 milímetros, aponta o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).

Depois da enchente do século passado, durante os anos 1971 e 1974, foi erguido o Muro de Mauá, principal estrutura do Sistema de Proteção Contra Cheias de Porto Alegre. Com 3 metros de altura e 2.647 metros de comprimento, o sistema ajudou a conter parte das inundações que vinha assolando a capital gaúcha nos últimos anos.

Diferente de 1941, quando o carro ainda não era a primeira opção de transporte, desta vez, além das estradas, o serviço aéreo da cidade também foi impactado. Com previsão de permanecer fechado até o fim de maio, o Aeroporto Salgado Filho foi completamente tomado pelas águas. O local está inoperante desde a última sexta-feira (3).

As chuvas que atingiram o estado provocam danos e alterações em 95 trechos de 41 rodovias com bloqueios totais e parciais, entre estradas e pontes. As informações são do Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer), consolidadas com o Comando Rodoviário da Brigada Militar (CRBM), abrangendo também rodovias concedidas e as administradas pela Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR). A Secretaria de Logística e Transportes (Selt) trabalha para desobstruir as rodovias o mais rápido possível, de maneira a garantir o tráfego de veículos e pedestres.

* Estagiário sob supervisão de Alfredo Mergulhão

Fonte: O Globo

© 2024 Blog do Marcos Dantas. Todos os direitos reservados.
Proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo deste site sem prévia autorização.