Sociedade civil brasileira é ‘autônoma e livre’, o que deve favorecer discussões do setor no G20

Representantes do C20, uma novidade da presidência brasileira do G20, participam de seminário na sede da editora Globo
Representantes do C20, uma novidade da presidência brasileira do G20, participam de seminário na sede da editora Globo — Foto: Thayz Guimarães

Há uma expectativa positiva entre organizações da sociedade civil do mundo todo com a presidência rotativa do Brasil no G20, o grupo das maiores economias do planeta, porque o “espaço público” no Brasil é mais aberto, na comparação com outros países”. A avaliação é de Henrique Frota, presidente do C20, um dos grupos de engajamento do G20 Social, que falou durante o seminário “O que a sociedade civil espera do Brasil: prioridades, desafios e parcerias”, nesta quarta-feira.

A mesa faz parte da primeira rodada de encontros com autoridades e especialistas, organizada por O GLOBO, Valor Econômico e CBN. Foram discutidas as principais agendas dos grupos, suas recomendações aos líderes da cúpula e a influência da sociedade civil na declaração final.

— É um ano de oportunidades, porque no Brasil há menos controle estatal, o espaço público é autônomo e livre — afirmou Frota, que também é diretor-executivo do Instituto Pólis e da Abong, associação que reúne as organizações não governamentais do país.

O G20 Social, uma novidade da presidência brasileira, conta com 13 grupos de engajamento (a “família 20”) e será um espaço de participação e contribuição da sociedade civil na formulação de políticas relacionadas à cúpula ligado à sociedade civil.

Durante o seminário, Frota explicou que os negociadores brasileiros têm procurado trabalhar apoiando os pares da Índia, que estava na presidência rotativa do G20 em 2023; e da África do Sul, que assumirá o posto em 2025.

— São dois países que têm espaço público para a sociedade civil mais limitado e controlado pelos governos — disse o presidente do C20.

Além de Frota, estiveram presentes Helena Nader, presidente da Academia Brasileira de Ciências e sherpa do Science20 (S20), grupo de engajamento que reúne as academias de ciência do G20; Constanza Negri Biasutti, sherpa do B20, fórum que reúne a comunidade empresarial global e o mais influente dentro da cúpula; e Beatriz Mattos, coordenadora de pesquisa da Plataforma Cipó, liderada por mulheres e dedicada a questões de clima, governança e paz. A mediação foi feita pela jornalista Flávia Barbosa, editora-executiva de O Globo.

Beatriz Mattos, da Plataforma Cipó, destacou, por sua vez, que “o financiamento sempre foi um ponto fundamental nas negociações climáticas”.

— Temos metas cada vez mais ambiciosas, mas não temos meios de implementação para isso — disse, citando uma lógica “geopolítica perversa”. — A maior parte das emissões vêm do Norte Global, enquanto os países do Sul Global serão aqueles frontalmente atingidos.

Ela citou como exemplo o paradoxo emblemático dos Estados ilhas, que são responsáveis por menos de 1% das emissões, mas estão fadados ao desaparecimento. Um relatório das Nações Unidas de 2023 mostra que metade da população mundial vivia em países altamente endividados, que gastavam mais com pagamento de dívidas do que com saúde e educação.

— O G20 é um espaço emblemático para lidar com isso. A crise climática não é só ambiental, é socioambiental. Tem a ver como nosso modelo de organização econômica, social e de consumo — afirmou ela que quer levar ao G20 a discussão sobre o princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas. — Temos aqui um janela de oportunidades, considerando a troika do G20, para fazer avançar as demandas do Sul Global, que não são necessariamente iguais, mas encontram uma certa convergência neste tema.

Assista aqui a transmissão:

No S20, o grupo de engajamento da comunidade científica, a presidência do Brasil pretende reforçar o foco na divulgação, ou seja, em levar o debate sobre ciência para o público em geral, disse Nader, principal negociadora do país.

— Vimos que é muito bom discutir ciência com os pares, mas temos que olhar para fora, sair da bolha — afirmou a presidente da ABC, que reforçou a intenção do S20 de ampliar os debates, incluindo entidades científicas de outros países menores e mais pobres, que não façam parte do G20.

Já no B20, o grupo de engajamento do setor privado, a ideia da presidência rotativa do Brasil é aumentar o foco em documentos que tragam recomendações práticas de ações para políticas públicas.

— Queremos trabalhar em recomendações mais enxutas, sem diagnóstico. Há excesso de diagnósticos hoje — afirmou Constanza Negri, principal negociadora do Brasil no B20.

Outra intenção é acelerar os trabalhos no B20. Segundo ela, tradicionalmente, as discussões no B20 têm sido lentas, com um fórum de debates em meados de cada ano, que leva à publicação de documentos de recomendação, quase sempre, perto dos encontros de cúpula.

— O B20, tradicionalmente, tinha um desafio que gostaríamos de tentar contornar, que é chegar muito tarde (no debate). Queremos concentrar mais as discussões no primeiro semestre, para, no segundo semestre, focar em advocacy e diálogo com os governos.

A primeira mesa contou com a participação de Maurício Lyrio, coordenador da trilha de sherpas (negociadores) do grupo; Marcos Caramuru, ex-embaixador do Brasil na China e conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri); Oliver Stuenkel, professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV); e Luciana Costa, diretora do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES). A mediação ficou a cargo do jornalista Francisco Goes, chefe de redação do Valor Econômico no Rio.

O Brasil assumiu a presidência rotativa do G20 pela primeira vez em 1º de dezembro, com mandato de um ano. O objetivo do país é promover três bandeiras centrais: combate à fome, pobreza e desigualdade; desenvolvimento sustentável e reforma da governança global. Para isso, estão previstas 130 reuniões que serão realizadas nas cinco regiões do país ao longo dos 12 meses e culminarão, em novembro, na Cúpula de Líderes do grupo.

O G20 reúne as 19 maiores economias do mundo, além da União Europeia e, a partir deste ano, a União Africana. O grupo responde por cerca de 85% do PIB mundial, 75% do comércio internacional e dois terços da população mundial. Sua principal atribuição é apoiar o crescimento e o desenvolvimento mundial por meio do fortalecimento da arquitetura financeira internacional e da governança nas grandes questões econômicas globais.

Fonte: O Globo

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