Polícia detém manifestantes pró-Palestina em universidades dos EUA e França em meio ao aumento de protestos em outros países

Manifestante exibe a bandeira da Palestina enquanto policiais bloqueiam a entrada a entrada da universidade após manifestação em solidariedade ao povo palestino em frente à Universidade Humboldt de Berlim.
Manifestante exibe a bandeira da Palestina enquanto policiais bloqueiam a entrada a entrada da universidade após manifestação em solidariedade ao povo palestino em frente à Universidade Humboldt de Berlim. — Foto: JOHN MACDOUGALL/AFP

A promotoria de Paris informou, nesta quarta-feira, que 86 pessoas foram detidas na sequência de uma operação policial para remover estudantes que participavam de uma manifestação pró-Palestina na Universidade de Sorbonne. Também nesta manhã, a milhares de quilômetros, a polícia de Washington fez várias prisões e começou a esvaziar um acampamento montado na Universidade George Washington (GW) desde 25 de abril. As intervenções policiais seguem uma onda de mobilização pró-palestinos que se espalhou pelas universidades dos EUA, mas que não se manteve restrita a essas instituições: também foram registrados protestos em universidades de países europeus, além da Austrália e México.

A polícia francesa agiu na noite de terça-feira depois que cerca de 100 estudantes ocuparam um auditório da universidade durante duas horas em “solidariedade” ao povo de Gaza, observou um jornalista da AFP no local. Segundo um comunicado do Ministério público, mais de 80 pessoas foram detidas, acusadas de uma série de crimes contra a ordem pública, que incluem “dano intencional, participação em um grupo com o objetivo de preparar violência contra pessoas ou destruição/dano à propriedade, rebelião, violência contra uma pessoa que exerce autoridade pública ou invasão das instalações de uma escola com o objetivo de perturbar a paz ou a boa ordem do estabelecimento”.

Os manifestantes serão mantidos sob custódia por 24 horas, tempo que pode ser prorrogado por mais 24 horas. Outra intervenção policial também foi registrada na Sciences Po Paris, onde os primeiros acampamentos foram montados no fim de abril.

Na segunda-feira, o primeiro-ministro francês, Gabriel Attal, reforçou ser contra o direito de perturbar as universidades francesas com os protestos. No último dia 27, dois dias da primeira atuação da polícia francesa contra os estudantes da Sorbonne, o premier afirmou que “nunca haverá o direito ao bloqueio” e “tolerância para as ações de uma minoria ativa e perigosa”.

Em Washington, não foi divulgado um número exato de detidos e nem quantos especificamente eram estudantes, mas as autoridades disseram aos jornais americanos que foram feitas “várias prisões”. Estudantes da GW estão em um acampamento desde o dia 25 de abril, segundo a BBC, e o porta-voz da polícia Thomas Lynch afirmou ao Washington Post que a mobilização cresceu nos últimos dias e “se tornou mais volátil”.

Até então descrito como um acampamento pacífico, houve uma escalada das tensões nos últimos dias após a polícia ter removido uma grande bandeira palestina hasteada em um prédio do campus —movimento classificado pela universidade como “ato agressivo de ilegalidade”. Na terça, os estudantes marcharam até a residência da reitora da universidade, Ellen M. Granberg.

Lynch disse que as forças chegaram ao acampamento por volta das 3h da madrugada (horário local) e que os manifestantes entraram em confronto com a polícia, que reagiu com spray de pimenta. O GW Hatchet, jornal independente organizado pelos universitários e citado pela BBC, afirmou que o “terceiro e último aviso” foi dado aos estudantes no mesmo horário citado pelo porta-voz e que todos aqueles que permanecessem no U-Yard e no trecho da H street “seriam presos”.

Em um comunicado, também citado pela BBC, a GW disse que “embora a universidade esteja comprometida em proteger os direitos dos estudantes à liberdade de expressão, o acampamento evoluiu para uma atividade ilegal, com violação direta de múltiplas políticas universitárias e regulamentos municipais.” A reitora tem sido crítica à mobilização estudantil e, há mais de uma semana, suspendeu vários estudantes que participaram do protesto.

Longe de ter um efeito dissuasor, a repressão policial e as punições praticadas por boa parte das universidades parecem funcionar como combustível aos protestos. A centelha originada no dia 18 de abril, na Universidade de Columbia, em Nova York, espalhou-se como um fogaréu por dezenas de universidades americanas, cruzou o Oceano Atlântico e atingiu ao menos duas instituições francesas. Mas, longe de aterem-se à Sorbonne e Sciences Po Paris, as manifestações espalharam-se também para Holanda, Reino Unido, Alemanha, Itália, Espanha, Áustria, Suíça, Irlanda, Dinamarca, Finlândia, Austrália e México.

Inspirados em seus colegas nos campi americanos e franceses, alunos de algumas universidades de elite multiplicaram as ocupações em salas de aula e centros acadêmicos, exigindo o fim das parcerias com instituições israelenses como forma de sanção à ofensiva lançada por Israel contra Gaza, após o ataque do Hamas contra de 7 de outubro, que deixou 1,2 mil mortos e fez mais de 240 reféns. Em sete meses, a represália levada a cabo pelo Estado judeu já deixou quase 35 mil mortos, com a maior parte das vítimas sendo mulheres e menores de idade.

Na Universidade de Amsterdã, centenas de estudantes ergueram um acampamento na segunda-feira à noite. A violência irrompeu brevemente quando um pequeno grupo de pessoas, empunhando sinalizadores, invadiu a manifestação principal. A polícia interviu de forma truculenta e desmantelou o acampamento, resultando na detenção de 169 pessoas. Todos foram liberados, exceto dois, ainda sob custódia por acusações de crimes de desordem pública.

Na noite seguinte, os manifestantes retornaram ao campus, erguendo barreiras nas estradas de acesso à universidade, vigiados por um forte contingente policial. Cerca de 50 manifestantes também protestaram na terça-feira em frente à biblioteca da Universidade de Utrecht e algumas dezenas na Universidade Técnica de Delft, de acordo com a agência de notícias local ANP. O Conselho Executivo da universidade informou nesta quarta-feira a realização de uma reunião com uma delegação de manifestantes para chegar a um acordo, e alguns edifício foram fechados devido à manifestação.

A Universidade de Leipzig informou em um comunicado que entre 50 e 60 pessoas ocuparam o anfiteatro da instituição, bloqueando as portas por dentro e instalando barracas no pátio. Segundo a instituição, os manifestantes barricaram as portas da sala de aula por dentro e ergueram tendas no pátio. A polícia também foi chamada, e uma queixa policial foi registrada. Foram iniciados processos criminais contra 13 pessoas por suspeita de invasão, e nenhuma prisão foi feita até o momento. Cerca de 40 manifestantes contrários à mobilização também se reuniram na região, informou a polícia.

Na madrugada de terça, a polícia dispersou uma manifestação após cerca de 80 pessoas montarem um acampamento de protesto em um pátio do campus da Universidade Livre de Berlim. Os manifestantes, alguns dos quais usavam o lenço kufiya, símbolo da causa palestina, sentaram-se em frente às tendas com cartazes. A instituição afirmou que, depois, os manifestantes tentaram entrar em salas e auditórios para ocupá-los. A polícia foi chamada, e algumas prisões foram realizadas por incitação ao ódio e invasão de propriedade. Danos contra a propriedade foram relatados e as aulas foram suspensas durante o dia.

Na Suíça, os protestos se espalharam por centros acadêmicos de Lausanne, Genebra e Munique. A Universidade de Lausanne disse em um comunicado que “não há motivo para interromper as relações” com Israel, como exigem os protestos. Já na Áustria, dezenas de manifestantes acamparam no campus da Universidade de Viena, montando barracas e pendurando faixas desde a semana passada.

Pequenos acampamentos também foram erguidos em universidades britânicas, incluindo em Oxford e Cambridge, segundo a Associated Press. Uma coligação de estudantes da University College London armou tendas no campus para pressionar, além de outras demandas, pelo desinvestimento em empresas que apoiam o que descreveram como “genocídio dos palestinos”, na sexta-feira. “Não sairemos até que a universidade atenda às nossas demandas”, afirmou um porta-voz do movimento, na quinta, citado pelo New York Times.

Um sindicato que representa os estudantes do Trinity College Dublin, em protestos contra a guerra em Gaza desde o ano passado, afirmou na semana passada que foram multados pela universidade em mais de € 214 mil (R$ 1,36 milhão) por perdas financeiras decorrentes das manifestações e outras questões. A universidade, que não tem fins lucrativos, citou em comunicado o “impacto financeiro negativo” dos protestos que bloquearam o acesso dos visitantes ao Livro de Kells, um manuscrito religioso medieval mantido na universidade.

Protestos também foram registrados na Universidade de Bolonha, na Itália, Roma e Nápoles. Estudantes de universidades espanholas também se mobilizaram: por mais de uma semana, dezenas montaram acampamento na Universidade de Valência, e manifestações semelhantes foram registradas na Universidade de Barcelona e na Universidade do País do Basco. Um grupo que representa estudantes da Universidade de Madri afirmou que irá intensificar seu protesto nos próximos dias, informou a AP.

Na Austrália, foram montados acampamentos nas principais universidades das cidades de Adelaide, Camberra, Melbourne e Sydney. A União Australásia de Estudantes Judeus afirmou, em um comunicado divulgado na quinta-feira, que estava “profundamente preocupada” com uma nova onda de assédio contra os estudantes judeus.

Universidades na Finlândia e Dinamarca também foram palco de protestos. Dezenas de manifestantes finlandeses montaram acampamento em frente à Universidade de Helsínquia, prometendo manter a mobilização até que a academia corte laços com instituições israelenses. Já na Dinamarca, um acampamento foi montado na Universidade de Copenhage.

No México, estudantes da Universidade Nacional Autônoma do México (Unam) também organizaram um acampamento na quinta-feira, exigindo o “fim do genocídio imperialista em Gaza”, bem como o rompimento das relações diplomáticas entre México e Israel e a libertação dos detidos nos protestos. A manifestação reuniu cerca de cem pessoas, entre árabes e judeus, além de contar com mais de 40 tendas. Uma assembleia foi organizada pelos estudantes para postular algumas regras e manter um ambiente de “alerta político”. (Com AFP, El País e NYT)

Fonte: O Globo

© 2024 Blog do Marcos Dantas. Todos os direitos reservados.
Proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo deste site sem prévia autorização.