Passageiro trans impedido de entrar em voo para Belém vai receber R$ 15 mil de indenização da Latam

Avião da Latam Brasil na pista do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, em dezembro de 2020.
Avião da Latam Brasil na pista do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, em dezembro de 2020. — Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo

O Tribunal de Justiça do Amapá condenou, nesta quarta-feira, a empresa aérea Latam a indenizar em R$ 15 mil um homem trans que foi impedido de embarcar em um voo de Macapá para Belém. Pedro Henrique de Oliveira planejou a viagem com quatro meses de antecedência para ver um show, mas não teve seu embarque autorizado por um funcionário que não aceitou seu documento oficial.

O objetivo de Pedro era chegar à capital paraense na véspera de um show para o qual já tinha comprado também os ingressos. Mas, no momento do embarque, apesar de estar com a certidão de nascimento em seu novo nome e a identidade em seu nome antigo, funcionários da empresa aérea não autorizaram seu embarque na aeronave devido à divergência entre o nome constante do bilhete de embarque e o que consta no seu documento de identificação com foto.

Pedro chegou a informar aos funcionários da Latam que iria a um show em Belém, mas não houve nenhuma solução apresentada para que ele embarcasse no voo que adquiriu. A solução da empresa foi remarcar a passagem para o dia seguinte. Segundo Pedro, nesta segunda tentativa de embarque, não foi exigida a apresentação de qualquer documento de identificação.

Em defesa, a Latam negou falha na prestação dos serviços e atribuiu ao passageiro a responsabilidade pelo não embarque por deixar de apresentar o documento de identificação com foto contendo o seu novo nome, correspondente àquele constante da reserva emitida. Apesar disso, a juíza do caso apontou que não havia controvérsia quanto à emissão do bilhete no novo nome de Pedro e que, no momento do embarque, ele apresentou certidão de nascimento atualizada e RG emitido com seu antigo nome.

A companhia aérea tentou se justificar apresentando na Justiça a documentação exigida para embarque de passageiros com nome social, mas segundo a magistrada, estas regras não se aplicam no caso de Pedro.

“Embora a requerida haja fundamentado sua defesa no fato de que o autor não poderia embarcar com ‘nome social’ no bilhete diverso de seu nome civil, a situação é diversa. Na verdade, Pedro já contava com seu novo nome civil, tanto é assim que apresentou sua certidão de nascimento atualizada no momento do embarque. Não se tratava de ‘nome social’, como quer fazer crer a ré, mas do nome reconhecido juridicamente como tal”, disse na sentença.

De acordo com a magistrada, havia somente divergência entre o nome constante da certidão de nascimento atualizada e no RG apresentado. “Não se pode alegar que era impossível verificar a identidade do passageiro no momento do embarque, visto que os documentos, em conjunto, possibilitavam a completa identificação dele (o RG contém foto, em conjunto com a certidão, que contém o nome constante do bilhete).

Ela ressaltou ainda que os dois documentos mencionam a filiação (nomes dos pais) e a data de nascimento (idênticas, por óbvio), além da informação de que Pedro não tem irmão ou irmã gêmeo ou gêmea, “o que exclui a possibilidade de que se tratasse de pessoa nascida dos mesmos pais, no mesmo dia”.

Ao finalizar o caso, a juíza ainda fez questão de registrar que o ordenamento jurídico brasileiro “repudia com veemência qualquer tratamento discriminatório baseado em orientação sexual ou identidade de gênero”, e citou inclusive a Constituição Federal de 1988, que “consagra como direito fundamental a igualdade (art. 5º) e a dignidade da pessoa humana” entre os fundamentos da República (art. 1º, III, CF).

“O ato atingiu pessoa que, por sua própria condição, já é vulnerável, em momento em que estava construindo uma nova história (pois acabara de adequar seu registro civil) e que, por isso, estava mais sensível a ações de discriminação”, finaliza a juíza Sara Zolandek.

Fonte: O Globo

© 2024 Blog do Marcos Dantas. Todos os direitos reservados.
Proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo deste site sem prévia autorização.