Novo pacote dos EUA ajuda, mas não resolve problemas da Ucrânia contra a Rússia; entenda

Oficiais de força policial especial caminham em frente a apartamentos destruídos por bombas aéreas durante a evacuação de moradores da vila de Ocheretine, não muito longe de Avdiivka, em Donetsk
Oficiais de força policial especial caminham em frente a apartamentos destruídos por bombas aéreas durante a evacuação de moradores da vila de Ocheretine, não muito longe de Avdiivka, em Donetsk — Foto: Anatolii Stepanov/AFP

A aprovação do Congresso dos EUA ao pacote de auxílio militar de cerca de US$ 61 bilhões (R$ 313 bilhões) para a Ucrânia reacendeu em Kiev a esperança de ter acesso ao que foi definido como uma “fonte de vida” para suas Forças Armadas por autoridades do Parlamento ucraniano. O pacote, que deve ser sancionado pelo presidente americano, Joe Biden, nesta quarta-feira, contudo, não atende a todos os pedidos do governo ucraniano — e pode ter impacto limitado no front.

Embora armas americanas vitais para o esforço de guerra ucraniano possam estar chegando ao campo de batalha dentro de dias, o envio atual não incluirá tudo o que o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, pediu a Washington ao longo dos meses, enquanto uma disputa entre os partidos Democrata e Republicano travou a pauta no Congresso americano.

As forças ucranianas enfrentam um momento delicado e de escassez de pessoal e recursos no campo de batalha. O país suspendeu, na terça-feira, a prestação de serviços consulares a seus cidadãos homens ente 18 e 60 anos no exterior, como forma de pressionar para que retornem ao país e se juntem às forças de defesa contra a invasão russa, e também ajudem nas atividades econômicas locais. No começo do mês, o Parlamento aprovou uma nova lei de mobilização, que obriga todos os homens entre 18 e 60 anos a se apresentarem para cadastramento em até 60 dias, reduz a idade mínima de convocação de 27 para 25 anos.

Em duas publicações nas redes sociais, entre terça e quarta-feira, Zelensky agradeceu aos líderes democrata e republicano no Senado — Chuck Schumer e Mitch McConnell, respectivamente — pela aprovação do pacote, e aos americanos pelo apoio contínuo, mencionando que o acesso a armas de longo alcance, sistemas de defesa antiaéreo e artilharia são “ferramentas essenciais para restaurar mais rapidamente a paz justa”. Contudo, cobrou rapidez na entrega dos equipamentos:

“A chave agora é a velocidade. A rapidez na implementação de acordos com parceiros sobre o fornecimento de armas aos nossos guerreiros. A rapidez na eliminação de todos os esquemas russos para contornar as sanções. A rapidez na procura de soluções políticas para proteger vidas do terror russo. Todo líder que não perde tempo salva vidas”, escreveu.

Acima de tudo, Zelensky diz que a Ucrânia precisa de munição para artilharia e mísseis de longo alcance para atacar as forças russas, juntamente com defesas aéreas para proteger cidades e infraestruturas-chave como bases militares, usinas de energia e fábricas de armas.

— Precisamos causar o máximo de danos possível em tudo que a Rússia usa como base para o terror e para sua logística militar — disse Zelensky em seu discurso noturno aos ucranianos na segunda-feira.

Para isso, ele disse, a Ucrânia precisa de mais sistemas de mísseis táticos de longo alcance — conhecidos como ATACMS e pronunciados “attack’ems” — para atacar atrás das linhas inimigas e profundamente no território ocupado pela Rússia. Os EUA enviaram um pequeno número de ATACMS, com um alcance de aproximadamente 160 km para a Ucrânia no ano passado, e eles foram usados para atacar duas bases aéreas russas em outubro. A Ucrânia vem pedindo uma versão de alcance mais longo que possa atingir alvos a cerca de 300 km de distância.

Munições de artilharia, como os projéteis de calibre 155 milímetros que se encaixam em lançadores padrão da Otan doados pelo Ocidente, têm sido escassas na Ucrânia por mais de um ano, já que as forças russas estão disparando 10 vezes mais no campo de batalha do que as tropas ucranianas desarmadas, disse Zelensky na semana passada.

O presidente também descreveu as defesas aéreas — e especificamente o sistema de mísseis antiaéreos Patriot, de fabricação americana — como “cruciais”. E ele vem pressionando por mais de um ano para obter caças F-16 para fornecer outra camada de defesa aérea.

O Pentágono preparou o que um funcionário dos EUA disse, na terça-feira, ser um pacote de ajuda militar de US$ 1 bilhão (R$ 5,1 bilhões) a ser enviado rapidamente para a Ucrânia assim que Biden assinar o projeto de financiamento. O pacote incluirá mísseis antiaéreos Stinger portáteis, projéteis de 155 milímetros, mísseis guiados antitanque e veículos de combate.

O funcionário dos EUA disse que o pacote também incluiria munições para os chamados sistemas de foguetes de artilharia de alta mobilidade, ou HIMARS, que podem lançar mísseis ATACMS. A fonte não confirmou se os ATACMS especificamente seriam parte da ajuda. O Pentágono tem resistido a discutir publicamente o uso dos mísseis na Ucrânia, em parte por preocupação de que poderia provocar uma escalada com a Rússia ao admitir que está enviando armas de longo alcance para a guerra.

Não está claro se os Estados Unidos enviarão outro sistema de defesa aérea Patriot para a Ucrânia, como Alemanha e outros aliados estão supostamente exigindo. Os sistemas são escassos e caros, e dar mais um à Ucrânia poderia significar retirá-lo da proteção de ativos americanos, seja domésticos ou internacionais.

Jens Stoltenberg, secretário-geral da Otan, disse na terça-feira que o pacote de ajuda americana permitiria “sistemas de defesa aérea avançados” para a Ucrânia, mas não especificou qual tipo. Stoltenberg também disse que os aliados estão trabalhando para entregar caças F-16 para a Ucrânia.

Até agora, os EUA se recusaram a doar quaisquer de seus aviões de guerra, embora a Força Aérea tenha ajudado a treinar algumas das várias dezenas de pilotos ucranianos que até agora estão aprendendo a pilotá-los. Funcionários disseram que cerca de 12 pilotos devem estar prontos para voar os F-16 até julho, mas tão poucos quanto seis dos jatos terão sido entregues à Ucrânia até então.

Embora o pacote de ajuda de US$ 61 bilhões seja designado como apoio à Ucrânia, funcionários do Pentágono disseram que até US$ 48 bilhões (R$ 246 bilhões) irão para fabricantes de armas americanas, seja para reabastecer os estoques americanos que foram quase esvaziados nos últimos dois anos de guerra ou para fabricar armas adicionais para a Ucrânia.

A infusão de US$ 1 bilhão que o Pentágono está preparando viria de fundos restantes, e o senador democrata Mark Warner, presidente do Comitê de Inteligência do Senado, disse que poderia estar “em trânsito até o final da semana”. Isso poderia ajudar imediatamente a fortalecer a linha de frente da Ucrânia, onde as forças precisam interromper rapidamente drones, jatos e bombardeiros leves russos, e impedir que a Ucrânia perca terreno.

Mas os funcionários ucranianos parecem céticos de que armas suficientes serão entregues rapidamente ou de forma consistente nos próximos meses para manter o impulso.

— Quando conseguirmos, quando tivermos isso em nossos braços, então teremos a chance de tomar esta iniciativa e avançar para proteger a Ucrânia — disse Zelensky ao programa “Meet the Press”, da NBC News, no domingo. — Depende de quão cedo recebermos esta ajuda.

As armas e munições enviadas para a Ucrânia geralmente são retiradas de ativos do Pentágono na Europa, com remessas coordenadas por uma equipe de cerca de 300 pessoas baseadas na Alemanha.

No entanto, por meses, os americanos e outros aliados têm repetidamente alertado que tinham poucas armas para dar à Ucrânia até que a produção de armas pudesse acompanhar a demanda voraz da guerra. Isso levou a embaixadora da Ucrânia nos Estados Unidos, Oksana Markarova, a questionar em uma entrevista publicada na terça-feira de onde viriam os novos pacotes de armas.

— Este equipamento está disponível? — perguntou Markarova ao jornal ucraniano Ukrainska Pravda. — Encontraremos, e produziremos, equipamento suficiente rápido o suficiente para consegui-lo?

O financiamento ajuda, disse ela, mas questionou se todas as armas e equipamentos “estão prontos para entrega.”

— Infelizmente, não — disse Markarova. (NYT)

Fonte: O Globo

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