No G20, Haddad afirma que Brasil vai propor taxação global de ‘super-ricos’

O ministro Fernando Haddad afirma que o Brasil vai propor taxação global de 'super-ricos' ao G20
O ministro Fernando Haddad afirma que o Brasil vai propor taxação global de 'super-ricos' ao G20 — Foto: Cristiano Mariz/Agência O GLOBO

Anfitrião da reunião de ministros de Finanças e presidentes de bancos centrais dos países integrantes do G20 (que reúne as maiores economias do mundo), Fernando Haddad quer usar o encontro no prédio da Bienal, em São Paulo, nesta semana para lançar uma proposta de tributação global do “super-ricos”, alvo de um dos projetos que ele conseguiu aprovar no Congresso no ano passado.

Em entrevista ao GLOBO por e-mail, o ministro da Fazenda afirmou que essa agenda é fundamental para o crescimento econômico sustentável no mundo. Disse ainda que pretende discutir com os colegas do grupo o modelo do fundo de recuperação das florestas.

Haddad defende uma bandeira brasileira na presidência do grupo: a reforma de instituições multilaterais como Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional (FMI). Veja a seguir os planos do ministro para os encontros, em suas palavras.

A agenda da nossa reunião reflete as prioridades do governo do presidente Lula e dos grupos de trabalho reunidos durante o G20. Vamos dedicar a primeira sessão a uma discussão sobre desigualdade nas suas diferentes dimensões. A segunda sessão será um debate sobre o estado da economia global. Será o momento para trocar experiências com os outros ministros do G20, para tentarmos coordenar nossas políticas macroeconômicas no sentido do lema do evento, que é construir um mundo justo e um planeta sustentável.

A terceira sessão será sobre tributação internacional. Vamos colocar na mesa uma proposta de tributação dos super-ricos, baseada nas melhores pesquisas disponíveis. A agenda de tributação da riqueza e da progressividade sobre a renda são essenciais para enfrentar os entraves econômicos da desigualdade e promover o crescimento econômico sustentável. Nossa agenda do G20 reflete, em grande medida, nossas prioridades e conquistas na agenda doméstica. A Reforma Tributária e a tributação dos fundos offshore (no exterior) e fundos exclusivos (voltados para a alta renda) nos dão a legitimidade e o impulso necessários para defender reformas mais ambiciosas em nível global. Ainda não posso entrar em detalhes sobre a proposta que apresentaremos, mas posso confirmar que continuaremos a defender a bandeira de tributação progressiva no G20.

A quarta e última sessão será sobre dívida e financiamento ao desenvolvimento. Há problemas sérios de endividamento em dezenas de países de renda baixa e renda média. Todos nós sabemos que precisamos destravar os recursos para os países em desenvolvimento e ajudá-los a sair de situações difíceis. Finalmente, teremos a oportunidade de receber os ministros de Economia africanos para uma reunião especificamente sobre os desafios do continente. Ainda ofereceremos as instalações da Bienal para um encontro do G7 e receberemos a reunião ministerial do Brics (grupo liderado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul).

A função do G20 é ser um mecanismo de coordenação. Esperamos avançar com nossa proposta de melhorar os mecanismos de tributação internacional. Também queremos dar uma contribuição positiva ao debate sobre dívida global, dando pela primeira vez um papel mais central às perspectivas de países devedores. Do debate sobre macroeconomia e desigualdade pode sair um menu de políticas para enfrentar as assimetrias distributivas nacionais e globais.

Nós pretendemos colocar em evidência para nossos pares distorções que precisam ser corrigidas por nós mesmos nos boards (conselhos) das instituições financeiras internacionais. Precisamos também trabalhar em conjunto com eles para fortalecer a capacidade dessas instituições de serem agentes da profunda mudança nos padrões de produção e consumo que são esperadas de todos em direção à descarbonização. O mundo mudou desde a criação dessas instituições, a governança global precisa atualizar o arranjo existente. Se um país pode ajudar a destravar esses temas, esse país é o Brasil.

A busca por novos instrumentos que permitam às economias emergentes enfrentar os desafios contemporâneos, inclusive as distorções do sistema econômico e financeiro atual e o financiamento do desenvolvimento sustentável, será tratada na reunião dos ministros do Brics, que ocorrerá à margem da reunião do G20.

O espaço fiscal pode ser encontrado via cortes de gastos ineficientes e privilégios injustificáveis, no aumento da base da arrecadação dos países, na formalização da economia e no combate a mecanismos de planejamento tributário distorcidos. Pode surgir também via condições de financiamento externo mais favoráveis. Nesse sentido, devemos ir além do debate sobre espaço fiscal e explorar novos instrumentos financeiros.

Nós acreditamos que o Plano de Transformação Ecológica (apresentado pela Fazenda) será uma referência para muitos países no futuro. As economias do Sul Global não estão equipadas financeiramente para desenvolver planos da escala financeira do Inflation Reduction Act dos EUA, do Plano Verde da União Europeia e do investimento em energias renováveis da China. Defendemos uma alternativa realista, mas ambiciosa. Medidas regulatórias que orientem o setor produtivo no sentido da descarbonização e favoreçam o investimento em áreas na vanguarda da indústria e da tecnologia.

Entendemos que a conta da conservação tem que ser compartilhada com os países desenvolvidos. Por isso, o Brasil propôs na COP28 (em 2023) um fundo global ambicioso para remunerar a conservação de florestas tropicais, e estamos aproveitando o G20 para avançar nos detalhes desse mecanismo. Essa iniciativa poderá beneficiar mais de 80 países em desenvolvimento que contam com cobertura de florestas tropicais.

A transição energética deve ganhar destaque nos debates, e isso é uma boa notícia para o Brasil. No ano passado, 93% da nossa eletricidade foram gerados a partir de fontes renováveis. Essa é uma meta que países desenvolvidos querem atingir no final da próxima década, mas já é uma realidade no Brasil. Precisamos promover a nossa matriz limpa e nos posicionar como a melhor alternativa para investimentos descarbonizantes. O Brasil tem todo o potencial de seguir expandindo a capacidade já existente de eólica, solar, biocombustíveis e de liderar novos mercados que estão surgindo, como hidrogênio, combustível sustentável de aviação. O governo não vai descansar enquanto o Brasil não se tornar a capital mundial da energia e da indústria verde.

Fonte: O Globo

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