Milei no TikTok é um alerta do risco argentino, mostra relatório da Comunicação da PUC-Rio

Javier Milei, candidato à Presidência na Argentina
Javier Milei, candidato à Presidência na Argentina — Foto: Luis Robayo / AFP

O candidato da extrema direita argentina, Javier Milei, tem uma presença no TikTok sete vezes maior do que Patricia Bullrich, do partido do ex-presidente Mauricio Macri, e 34 vezes maior do que a do candidato peronista Sergio Massa. A análise foi feita pelo Nutec-Lab, o laboratório do Núcleo de Tecnologia do Departamento de Comunicação da PUC-Rio.

A descoberta é importante porque o candidato tem um apoio grande entre os jovens para as suas propostas radicais. E inviáveis. O fenômeno é o mesmo visto no Brasil, em que o discurso anti-política acaba atraindo os votos dos descontentes e coloca no poder alguém despreparado e com más intenções em relação à democracia. Por isso é valiosa essa medição dos estudantes e professores da PUC na rede mais popular entre os muito jovens.

O relatório do Nutec-Lab foi feito a partir de análise recente, do dia 4 de setembro, e mostra que Javier Milei tem 1,4 milhão de seguidores, Bullrich tem 213 mil e Massa 42 mil.

– Três grandes temas se sobressaem em seus vídeos nessa mídia social: um discurso anti-política e antiestablishment, um foco nas suas propostas de extinção do Banco Central e dolarização da economia e uma ênfase na sua proposta de redução do Estado e do número de ministérios – aponta o levantamento.

O relatório alerta que uma pesquisa de julho, da Zuban e Córdoba, mostra que Milei tinha 40% das intenções de votos entre os jovens de 16 a 30 anos, “quase o dobro do seu rival mais próximo”.

A sensação ao ver os dados é de que o país vizinho está vivendo o mesmo fenômeno que levou ao pesadelo que acabamos de deixar para trás. Há um uso abusivo da palavra “liberdade”, que vem acompanhada de palavrões, mas que não tem contornos nítidos. Aqui Bolsonaro sempre usou a palavra liberdade enquanto programava um golpe de Estado, como sabemos.

O estudo dividiu os temas que mais aparecem na mensagem do candidato. No terceiro maior, 21% são dedicados à venda da ideia de “transformar” a Argentina, como Donald Trump também fazia na sua campanha, e adotando “uma estratégia não tradicional, anunciando mudanças substanciais e desafiando o status quo”, diz o relatório da PUC.

– Nos discursos de Javier Milei é notável um forte apelo à ideia da liberdade com elemento central com uso extensivo de palavrões – aponta o texto.

No segundo maior grupo de mensagens, 33% são vídeos, do tipo aula, em que o candidato defende suas ideias econômicas, completamente inaplicáveis, de acabar com o Banco Central e dolarizar a economia. Como a Argentina vive uma longa hiperinflação, como vivemos aqui, culpar um órgão como o BC é o mais fácil. A proposta de dolarizar a economia parece remédio milagroso, mas a primeira dificuldade técnica é que a Argentina não tem dólares, não tem reservas cambiais. Nesse grupo de mensagens há sempre críticas aos políticos, para fortalecer a ideia de que ele é um candidato contra o sistema.

No maior grupo de mensagens, com 45% das postagens, há críticas ao excesso de gastos públicos e propostas de redução do número de ministérios, com a ideia, que também nos soa familiar, de que os ministérios são “projeto de doutrinação”. O tema da redução do Estado “alcança o maior número de interações e o da política monetária em visualizações”.

A pesquisa foi feita em três etapas: coleta de dados, transcrição e análise dos discursos, com o uso de ferramentas técnicas. O que ela nos traz é esse alerta de que, sendo mais eficiente nas redes sociais mais utilizadas pelos jovens, a extrema direita, que tem um projeto absolutamente ultrapassado e perigoso, constrói a falsa imagem de um candidato moderno e libertador.

Na época da hiperinflação no Brasil, usava-se a propaganda de uma vodca, chamava-se “efeito Orloff”, que dizia “eu sou você amanhã”. Parece que é isso que a Argentina está nos dizendo com essa campanha.

Fonte: O Globo

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