Investigada, presidente do Peru diz que pegou relógios de luxo emprestados de governador: ‘Já devolvi’

A presidente do Peru, Dina Boluarte
A presidente do Peru, Dina Boluarte — Foto: EFE/ Bienvenido Velasco

A presidente do Peru, Dina Boluarte, negou ter cometido qualquer crime e disse pegou a coleção de relógios de luxo — pela qual é investigada, num inquérito sobre o suposto cometimento do crime de enriquecimento ilícito e omissão de declarações em documentos públicos — emprestada do governador de Ayacucho, Wilfredo Oscorima, a quem descreveu como “amigo e irmão”.

— Devo admitir que foi um erro tê-los aceitado como empréstimo. A vontade de representar bem o meu país me levou a aceitá-los, mas já os devolvi. Como não são de minha propriedade, não era obrigada a declará-los — afirmou Dina Boluarte, aos jornalistas.

A mandatária concedeu entrevista coletiva depois de prestar depoimento durante cinco horas às autoridades do país. Oscorima tornou-se o centro das atenções nesta trama nas últimas horas. Não só pela predileção pelos relógios da marca Rolex, que tem ostentado em inúmeras aparições públicas, mas também por uma coincidência de datas que pode ligá-lo a Boluarte.

Héctor Banchero Herrera, gerente da Casa Banchero, importadora autorizada de Rolex no Peru, forneceu ao Ministério Público um registro de suas vendas que inclui Oscorima. O documento indica que, em 31 de maio de 2023, ele adquiriu um Rolex, modelo Datejust 36, com 18 quilates e cristal de safira. A data não é um detalhe menor: foi o dia em que Dina Boluarte completou 60 anos.

Conforme indicado no portal da Transparência, à tarde, Oscorima visitou a Presidência do Conselho de Ministros. Não se passaram mais de 25 minutos no encontro dele com o conselheiro Fritz Köhne Fulchi. Uma semana depois, em 7 de junho, a presidente usou um Rolex com características idênticas num evento público. Poderia realmente ter sido um empréstimo, como ela afirma?

Na quinta-feira, Oscorima foi convocado pelo Ministério Público, mas não respondeu às perguntas dos investigadores. Por meio de seu advogado, ele negou ter dado um Rolex a Boluarte. Em 2010, Oscorima deu dois relógios a dois juízes do Supremo Tribunal de Justiça.

O governado-regional de Cusco, Werner Salcedo, afirmou que Oscorima lhe deu duas imitações de Rolex e “emprestou-lhe” um original.

— Já foi devolvido semanas atrás. Não tenho nada a esconder. Pelo contrário, concordo com as investigações — afirmou.

Durante sua defesa, Boluarte também se referiu às suas joias, estimadas em mais de US$ 500 mil, incluindo uma pulseira Cartier avaliada em US$ 56 mil. Mais uma vez, ela negou ter cometido qualquer crime.

— Disseram que eu estava usando Cartier? Esta pulseira é bijuteria, e eu a uso publicamente e de forma transparente. Falaram também de um conjunto de colar e brincos com pérolas cultivadas por 70 mil dólares. Completamente falso. Estes brincos e este colar são da marca Unique. Eu os tenho há oito anos — disse ela, apontando para uma caixa modesta.

O Congresso do Peru rejeitou, na última quinta-feira, dois novos pedidos de destituição contra a presidente Dina Boluarte, promovidos pela oposição devido ao escândalo dos relógios Rolex e das joias não declaradas.

As moções, que acusavam Boluarte de “incapacidade moral permanente” para prosseguir até o final do seu mandato em 2026 “não foram admitidas”, de acordo com o presidente do Congresso, Alejandro Soto, após o final das votações, realizadas separadamente.

O primeiro pedido, do partido Peru Libre, de esquerda, obteve 33 votos, enquanto o segundo, feito pelo Câmbio Democrático-Juntos, obteve 32. O mínimo para a proposta ser aprovada era de 48 votos, já que é necessário o voto favorável de “pelo menos 40%” dos parlamentares elegíveis.

Entre os partidos de direita, votaram contra as moções parlamentares Força Popular, Renovação Popular, Aliança para o Progresso e Avança País. O partido Podemos Peru se absteve.

Na noite de segunda-feira, em meio ao escândalo da investigação, seis membros do Gabinete da presidente renunciaram , e foram substituídos por seis novos ministros, empossados por Boluarte. A reestruturação do gabinete serviu para atender a negociações com o Congresso, em tentativa de assegurar apoio dos parlamentares à presidente.

A presidente peruana está na mira da polícia desde o dia 30 de março, quando cerca de 40 agentes e promotores realizaram uma operação de busca em sua casa. O objetivo era revistar o endereço e apreender os relógios Rolex da mandatária. A procedência e aquisição dos itens de luxo não foram explicadas por Dina.

Cerca de oito relógios de menor valor foram encontrados na operação. Em suas aparições públicas, Dina já foi vista com pelo menos três modelos de Rolex, que não foram ainda localizados pelas autoridades.

A operação foi realizada depois que o Ministério Público não aceitou que a presidente pedisse o reagendamento de uma diligência marcada para o início da semana em que ela mostraria os relógios e seus recibos de compra.

Se for acusada, a presidente não poderá ser julgada até julho de 2026, quando termina o seu mandato, conforme estabelece a Constituição do país. A investigação, no entanto, pode seguir. O escândalo pode levar a um pedido de vacância (demissão) de Dina no Congresso, sob alegação de “incapacidade moral”.

Fonte: O Globo

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