Incerteza sobre desinflação global é muito maior, diz Campos Neto

Roberto Campos Neto
O presidente do BC (Banco Central), Roberto Campos Neto, durante entrevista ao Poder360

O presidente do BC (Banco Central), Roberto Campos Neto, disse que a desinflação global tem um cenário de incerteza “muito maior”. Declarou que a autoridade monetária tenta navegar nesse ambiente para dar mais transparência à decisão de política monetária.

Campos Neto palestrou durante o evento Legend Day, promovido pela Legend Capital, em São Paulo. O presidente conversou com Daniella Marques, sócia e chairwoman da Legend Invest e ex-presidente da Caixa no governo Jair Bolsonaro (PL).

Assista (1h7min20):

Campos Neto disse que não há como dar projeção de política monetária, mas citou que, se as incertezas diminuírem, o Banco Central “voltará” a ter o plano de voo estabelecido anteriormente. A Selic está em 10,75% ao ano. A próxima reunião será em 7 e 8 de maio.

O Copom (Comitê de Política Monetária) adotou uma sequência de cortes da taxa básica de 0,5 ponto percentual a cada reunião. No último encontro, de março, anunciou que poderia diminuir o ritmo, mas somente na reunião de junho.

Na 4ª feira (17.abr), parte do mercado financeiro entendeu o discurso de Campos Neto como uma possibilidade de corte de 0,25 ponto percentual já em maio.

O presidente do BC disse que “o fantasma chegou” ao citar o repique da inflação dos Estados Unidos, que subiu para 3,5% em março.

“Acho que é importante a gente concatenar o sequenciamento do que a gente pensa. […] Eu não tenho como dar um guidance (guia para o que esperar da política de juros futura) porque eu tenho uma incerteza muito grande. […] Um cenário é se a incerteza diminuir e a gente voltar para a nossa forma de atuação que a gente tinha começado. O outro cenário é esse aumento de incerteza ficar mais tempo e criar ruídos crescentes. E aí a gente vai ter que trabalhar em como é que vai ser o ‘pace’ (ritmo de corte de juro)”, disse.

Ele afirmou ainda que o crescimento da volatilidade pode subir mais, o que pode impactar o balanço de risco do Banco Central na política monetária. “Outro cenário é quando isso (incertezas) chegam a um ponto onde muda as variáveis de tal forma que fazem com que a realidade que a gente projetou não seja mais a verdadeira”, disse.  

Questionado sobre qual cenário é o mais provável, ele respondeu: “vocês vão saber na reunião do Copom”.

O presidente do BC reforçou que os economistas têm errado projeções para o crescimento econômico. Diferenciou, porém, dos equívocos nas estimativas nos primeiros anos da pandemia de covid-19, como em 2020 e 2021. Afirmou que houve um “erro global” na época por causa do esforço fiscal e monetário para levantar a atividade econômica.

“A gente conseguiu ter uma coordenação muito grande do monetário e do fiscal. O monetário já virou. Os países já subiram juros. Alguns países subiram e já começaram a cair [os juros]”, disse.

Sobre a política fiscal, Campos Neto declarou que o comportamento da política fiscal não foi o mesmo. “Alguns países fizeram algum tipo de ajuste fiscal, mas o fiscal está descolado do monetário, principalmente Estados Unidos, Europa e Japão um pouquinho também”, declarou.

O Poder360mostrou que as pautas-bomba que tramitam no Legislativo têm potencial de impactar em até R$ 80,8 bilhões as contas públicas em 2024.

O presidente do BC disse que a dívida somada dos 3 países corresponde a 2/3 do endividamento soberano mundial. Antes da pandemia, custava 1% para rolar a dívida. Agora, é de 3,2%, segundo Campos Neto. “Eu vejo que isso em algum momento vai virar um tema de sustentabilidade da dívida e o fiscal vai ficar mais no foco”, disse.

Campos Neto disse que o desempenho da Bolsa de Valores brasileira está “um pouquinho” pior que a média dos países emergentes. Disse que há peculiaridades no país que contribuem para esse movimento.

“Tem bastante peso de empresas estatais, aí teve um tema de ruído de governo das empresas estatais. Tem um tema que tem pesado também que é nossos juros mais altos, que a taxa de desconto é mais alto. A perspectiva de que o risco de prêmio que entra pela Bolsa na parte fiscal tem piorado um pouquinho também”, disse.

O presidente do BC declarou que uma NTN-B (Notas do Tesouro Nacional Série B) –que é um título público do governo– com vencimento no longo prazo com juros reais acima de 6% ao ano explica “um pouco” porque a Bolsa não sobe.

“As pessoas para emprestarem dinheiro para o Brasil no longo prazo estão cobrando uma taxa de juros real de 6%. Isso não tem nada a ver com o Banco Central. Isso é uma percepção de risco Brasil”, declarou.

Campos Neto afirmou que houve uma recente precificação dos ativos potencializado pelo cenário externo. Citou a possibilidade de os Estados Unidos cortarem os juros mais para o fim do ano e que o tema fiscal ficou “mais importante”.

“Se eu tenho muita dívida e uma taxa de juros mais alta por mais tempo, a sustentabilidade da dívida passa a ser um tema globalmente falando. Isso também impacta o Brasil”, declarou. “Qualquer um que participou das reuniões do FMI viu a quantidade de bancos centrais e autoridades dizendo que estão preocupados com o tema da sustentabilidade da dívida”, completou.

O presidente do BC é favorável à PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 65/2023, que trata sobre a ampliação da independência do Banco Central do Poder Executivo. Em fevereiro de 2021, Bolsonaro sancionou o projeto de lei 19 de 2019 do BC, que estabeleceu mandatos dos diretores e maior autonomia operacional.

Fonte: Poder360

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