O Ministério da Justiça abriu um processo por “desrespeito a determinações contratuais” contra a construtora responsável pela reforma no pátio do presídio federal de Mossoró (RN), de onde dois detentos escaparam em 14 de fevereiro. Eles continuam foragidos.
A Construtora Dantas cuidava do canteiro de obras da reforma que acontecia no pátio do banho de sol da unidade. Nesse local, os dois presos arranjaram uma ferramenta para cortar a cerca de alambrado — a última barreira que os separava do mundo exterior. Segundo as investigações da PF, o objeto foi fundamental para a evasão de Deibson Nascimento e Rogério Mendonça e não estava guardado de forma adequada. Procurada, a empresa não se manifestou.
A Polícia Federal requisitou os dados de todos os funcionários que trabalharam na obra para saber se algum tem ligação com o crime organizado. Nascimento e Mendonça são vinculados ao Comando Vermelho e planejavam fundar uma nova facção criminosa no Acre, segundo apurações do Ministério Público estadual.
A construtora ganhou um contrato de R$ 575 mil para a “construção de muro em estrutura de concreto armado para divisão do pátio de sol das vivências da Penitenciária Federal em Mossoró”, segundo o documento. O período de vigência das obras seria de 17 de abril de 2023 a 17 de agosto de 2024.
Procurado, o Ministério da Justiça confirmou que a construtora passou a ser investigada pela PF e que era dela a obrigação de guardar as ferramentas utilizadas na reforma.
“Foi instaurado um procedimento sancionatório contra a Construtora Dantas, por desrespeito a determinações contratuais, especialmente no que diz respeito à obrigação de controle e guarda das ferramentas utilizadas na obra”, diz o texto enviado ao GLOBO.
“O processo foi aberto pelo Núcleo de Sanções da Diretoria-Executiva, da Senappen (Secretaria Nacional de Políticas Penais), para apurar irregularidades no contrato”, acrescentou.
Após fugir por meio de um buraco aberto no vão da luminária, os detentos conseguiram acessar o canteiro de obras que era protegido apenas por um tapume. Lá, encontraram a ferramenta que permitiu a abertura da passagem nas grades.
Os investigadores consideraram suspeita a maneira como os objetos foram deixados no local ao invés de serem acondicionados em um recinto fechado. Outro fato estranho que chamou atenção é que uma luminária do lado de fora do presídio estava com o disjuntor desligado.
A PF abriu um inquérito para apurar se houve facilitação na fuga por parte de algum agente penitenciário ou funcionário terceirizado. A Senappen também instaurou uma sindicância paralela para apurar as circunstâncias do ocorrido.
O sócio-administrador da empresa, Rafael Dantas, é réu em pelo menos duas ações penais na Justiça do Rio Grande do Norte pelos crimes de fraude em licitações e associação criminosa. Procurado por meio de seu telefone e advogado, ele não quis se pronunciar.
Dantas foi denunciado junto com outros empresários por ter “frustrado mediante montagem e combinação, em comunhão de desígnios, o caráter competitivo” de licitações no município de Parnamirim, na Região Metropolitana de Natal. Os contratos se destinavam a pavimentar ruas e construir obras públicas da cidade, onde fica a sede da empresa. O suposto esquema também envolvia um secretário de obras da prefeitura de Parnamirim.
Segundo a promotoria, os empresários, entre eles Dantas, tinham vínculos de amizade ou parentesco e “participavam da mesma licitação simulando uma competição”. Em um das ações penais, o MP aponta que o grupo da família Dantas ganhou R$ 999,1 mil em contratos entre 2009 e 2015.
“Foi possível coletar evidências contundentes da prática de fraude licitatória nas formas de fracionamento indevido de despesas e, sobretudo, de rodízio entre as mesmas empresas construtoras”, diz a promotoria em uma denúncia obtida pelo GLOBO.
“Na realidade, não havia real competição licitatória entre as empresas construtoras rés, mas sim um bom relacionamento pessoal e financeiro entre os licitantes (…) que atuam no mesmo ramo da construção civil”, complementa.
Conforme o portal da Transparência, a Construtora Dantas recebeu R$ 5,5 milhões em recursos públicos por contratos firmados com o governo federal. Trata-se de obras contratadas pelos Ministérios da Educação e da Justiça para obras em institutos federais do Rio Grande do Norte e Paraíba e do Departamento da Polícia Rodoviária Federal da Paraíba, além da penitenciária de Mossoró.
Fonte: O Globo