Fuga em Mossoró: falta de pistas, chuvas e cansaço marcam o primeiro mês da caçada

Rogério e Deibson: dupla escapou da Penitenciária Federal de Mossoró (RN)
Rogério e Deibson: dupla escapou da Penitenciária Federal de Mossoró (RN) — Foto: Reprodução

A fuga de dois detentos da penitenciária de segurança máxima de Mossoró (RN) completa um mês nesta quinta-feira (14) sem pistas relevantes e com a força-tarefa desmotivada e cansada.

Depois de uma série de pistas desperdiçadas por vazamentos de informações ou atropelos na estratégia de buscas, a caçada entrou em um ponto de estagnação.

Apesar da declaração do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, de que as buscas têm ocorrido “com êxito”, na força-tarefa formada por policiais federais, penais, e rodoviários federais, o clima predominante é de cansaço e desânimo.

De acordo com fontes que estão em campo no Rio Grande do Norte, a última pista de que os fugitivos estariam na região de Baraúna, onde a força tarefa se concentra, foi identificada no último domingo (10).

Mesmo assim, foi uma pista um tanto vaga: moradores de uma casa na zona rural perceberam que seu cachorro estava latindo muito, estranharam o comportamento atípico e chamaram os policiais. Os cães farejadores identificaram o cheiro dos procurados e a força-tarefa aumentou as buscas no entorno. Mas os policiais não encontraram nada e, depois disso, não houve mais nenhum avanço.

Policiais envolvidos na operação relatam que, além das 400 cavernas que existem na região, a força-tarefa de 500 agentes têm lidado com obstáculos como as fortes chuvas na região, que tem apagado rastros deixados pela dupla e dificulta o deslocamento das equipes para áreas mais isoladas só acessíveis por estradas de terra.

A polícia também já confirmou que eles estão sendo ajudados por moradores – seja por coação ou por ligação com o crime organizado.

Embora todos os indícios sejam de que os fugitivos ainda estão na região, entre esses homens já começa a haver um temor de que eles possam ter escapado para outro estado.

Ainda assim, o ministro da Justiça sobrevoou a região na tarde desta quarta-feira e depois deu uma entrevista coletiva em que afirmou que a operação de buscas está se desenvolvendo “com êxito”.

“O resultado prático a meu ver é que eles não conseguiram escapar deste perímetro, eles estão cercados. Se não fosse a eficiência das polícias eles já estariam distantes. Embora não tenham sido recapturados, eles se mantêm nesse perímetro original”, justificou Lewandowski.

Rogério da Silva Mendonça, chamado de Martelo, e Deibson Cabral Nascimento, conhecido como Deisinho ou Tatu, escaparam no dia 14 de fevereiro do presídio de segurança máxima de Mossoró. Os dois são acusados de terem ligação com a facção criminosa Comando Vermelho.

A primeira fuga do complexo penitenciário federal, criado em 2006 para abrigar presos de alta periculosidade, também gerou a primeira crise da gestão do ministro Lewandowski, que assumiu o comando da pasta em 1º de fevereiro – e justamente na segurança pública, em uma das áreas mais sensíveis do governo Lula.

Essa é ainda uma das mais longas caçadas a um fugitivo na história do país. Já superou o tempo levado na busca do assassino Lázaro Barbosa, que matou quatro pessoas de uma família de Ceilândia, no Distrito Federal, e era procurado também por crimes de roubo, estupro e porte ilegal de arma de fogo.

Lázaro ficou migrando de uma cidade para outra no estado de Goiás até ser morto pela polícia goiana, em junho de 2021.

O tempo e a falta de resultados concretos tem levado a equipe de buscas ao cansaço e o desânimo, notados por quem acompanha o dia a dia do pessoal.

Há um esquema de rodízio, ou seja, os agentes não todos estão em campo ao mesmo tempo. Eles foram divididos em dois turnos diferentes – de dia e de noite – que rastreiam um perímetro de 20 quilômetros.

Dos agentes envolvidos na busca, cerca de 90% são de fora de Mossoró, e muitos já dizem reservadamente se sentir em uma busca inútil. A força-tarefa reúne agentes da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Força Nacional de Segurança e Polícia Militar do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Ceará.

“O desânimo de não ter mais informações sobre o paradeiro dos fugitivos gera até dúvidas se eles estão mesmo nessa região”, diz uma fonte envolvida na caçada. “O cansaço a gente vence quando tem mais informação, mas não é o caso. Não temos um norte.”

Até as condições climáticas e a geografia local favorecem os fugitivos, Com as chuvas persistentes, os veículos de menor porte usados no início da operação, mais baixos, não conseguiam passar por buracos e pedras que surgiam nas estradas de terra que dão acesso a zonas mais remotas. Só com a chegada de mais picapes, após alguns dias, o trabalho foi facilitado.

Como a região é dominada por plantações de frutas – principalmente banana, melancia, melão e mamão –, não é difícil para os fugitivos invadi-las para se alimentar. No final do mês passado, aliás, moradores relataram terem visto os dois homens em uma plantação de banana.

As oportunidades perdidas também pesam no moral da equipe – há queixas de desarticulação no comando da força-tarefa, de falta de integração das diversas equipes e de frequentes vazamentos à imprensa.

As discussões internas sobre o estrago provocado por vazamentos de informações sensíveis começaram logo no início das buscas, mais precisamente no dia seguinte à fuga, quando o secretário de Políticas Penais, André Garcia, declarou em uma entrevista coletiva que a polícia estava utilizando drones com sensores de calor para localizar pessoas no meio da mata.

Àquela altura, os investigadores acreditavam que os drones ajudariam a localizar os fugitivos rapidamente, mas aos poucos concluíram que eles, ao saber dos drones, passaram a se esconder nas muitas cavernas da região e cavar buracos para dormir e descansar sem ser identificados.

Até aqui, o único êxito tem sido o dos próprios fugitivos em driblar a força-tarefa de Lewandowski.

Fonte: O Globo

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