Escassez de medicamentos afeta mais de 350 mil pessoas com doenças crônicas em Gaza: ‘estamos morrendo lentamente’

Barracas e tendas montadas em campo para deslocados palestinos em Rafah
Barracas e tendas montadas em campo para deslocados palestinos em Rafah — Foto: Mohammed Abed/AFP

Mohammed Khader vai de uma farmácia para outra na cidade de Rafah, no sul da Faixa de Gaza, procurando desesperadamente pelos medicamentos de seus parentes em meio a uma escassez cada vez maior após quatro meses de guerra. Ele é apenas um dos centenas de milhares de palestinos deslocados levados para a cidade mais ao sul do território pela implacável campanha militar de Israel contra o grupo terrorista Hamas.

— Esta é a quinta farmácia que eu procuro — disse o jovem que foi deslocado do campo de refugiados de Jabaliya para Rafah. — Encontrei apenas um tipo dos três (de medicamento) prescritos pelo médico. Meu pai tem um tímpano perfurado pelos bombardeios e está constantemente com dor.

Ele disse que sua irmã tem lúpus crônico e precisa de quatro tipos de tratamento, mas apenas um está disponível.

— Sua saúde está deteriorando rapidamente. Ela está com muita dor e não podemos fazer nada.

O Ministério da saúde na Faixa de Gaza, controlado pelo Hamas, alertou nesta semana sobre “a escassez de medicamentos e suprimentos médicos e a incapacidade de fornecer mais de 60% da lista essencial de medicamentos básicos de cuidados de saúde primários”. Disse que 350 mil pessoas em Gaza que têm doenças crônicas não têm medicamentos, alertando para “complicações de saúde graves para os pacientes”.

O farmacêutico Mohammed Sahwil disse de sua farmácia em Rafah que a saúde no território está passando por “um período catastrófico”.

— Nem todos os tipos de medicamentos estão disponíveis, especialmente para doenças crônicas como coração, pressão, diabetes e câncer — disse ele. — Há escassez de medicamentos para crianças, antibióticos e até analgésicos. Até mesmo medicamentos alternativos que podem ajudar em alguns casos acabaram meses atrás.

Em outra farmácia, Abdul Hadi Dahir pediu desculpas a um homem que procurava medicamentos para Parkinson, enquanto uma mulher também deixava a loja de mãos vazias.

— A necessidade de medicamentos atingiu o pico, especialmente com a disseminação de doenças e epidemias devido à superlotação, má nutrição e condições de vida — disse Dahir à AFP.

Ele disse que muitas pessoas que ele vê exibem sintomas de hepatite.

— Sentimo-nos impotentes. Não há medicamentos e não podemos intervir sem as instruções dos médicos.

Cerca de 1,4 milhão de palestinos, mais da metade da população de Gaza, agora estão amontoados em Rafah em condições humanitárias precárias e com alto risco de doenças, segundo as Nações Unidas.

A Faixa de Gaza está sob cerco israelense desde 2007, quando o Hamas assumiu o poder, mas apenas pequenas quantidades de ajuda foram permitidas no território desde o início da guerra entre Israel e o Hamas há mais de quatro meses.

O Ministério da Saúde alertou que a aglomeração de tantas pessoas deslocadas e o clima frio “aumentaram a disseminação de doenças respiratórias e de pele e outras doenças infecciosas”, incluindo hepatite A.

A guerra eclodiu em 7 de outubro passado depois que o Hamas lançou um ataque sem precedentes ao sul de Israel, resultando na morte de cerca de 1.160 pessoas, a maioria civis, segundo uma contagem da AFP com base em números oficiais israelenses. Israel respondeu com uma ofensiva militar devastadora contra Gaza, que matou 28.663 pessoas, de acordo com o último balanço do Ministério da Saúde.

Em Rafah ocidental, mais de 200 pessoas ficaram na fila do lado de fora da farmácia do Hospital Kuwaiti, esperando sua vez com prescrições médicas em mãos.

— Ficamos horas esperando por um único comprimido — disse Jihan al-Quqa, que chegou à farmácia cedo pela manhã. — Eles nos dão um analgésico, mas não há antibióticos ou tratamentos. As crianças e os idosos estão doentes.

A mulher deslocada de Khan Younis acrescentou:

— Meu marido sofre de hipertensão e diabetes e a perna dele está inchada, mas não podemos conseguir remédio para ele.

Abdullah al-Hajj, cuja perna foi amputada, espera em uma cadeira de rodas.

— Não há farmácia em Rafah que tenha analgésicos para que eu possa dormir à noite — disse ele.

O sistema de saúde de Gaza está à beira do colapso total. As Nações Unidas relatam que nenhum dos hospitais do território está operando normalmente e apenas 13 de 36 instalações estão parcialmente operacionais.

A Organização Mundial da Saúde alertou na quarta-feira que os hospitais em Gaza carecem de suprimentos suficientes. Os médicos são forçados a amputar porque não têm os medicamentos necessários para salvar os membros dos pacientes, segundo Rik Peeperkorn, representante da OMS em Gaza.

Todos os dias, Nabil al-Othmani, de 60 anos, procura em vão por seu medicamento para epilepsia.

— Eles me dizem que não está disponível de forma alguma — disse ele, tentando conter as lágrimas.

Mohammed Yaghi, deslocado de Gaza, acrescentou:

— Estamos morrendo lentamente por falta de medicamentos e tratamento dentro da cidade de Rafah.

Fonte: O Globo

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