Envelhecimento da população faz Japão encerrar festival milenar com homens seminus

Envelhecimento da população faz Japão encerrar festival milenar Sominsai, com homens seminus
Envelhecimento da população faz Japão encerrar festival milenar Sominsai, com homens seminus — Foto: Philip Fong/AFP

Centenas de homens quase nus lutam por um saco de talismãs de madeira, envoltos em vapor de suor. Este foi o final dramático de um antigo ritual celebrado neste sábado pela última vez no Japão. Os cantos apaixonados de “jasso, Jewela” (que significa “deixe o mal ir”) ecoaram por uma floresta de cedro na região de Iwate, no norte do Japão, onde o isolado templo Kokuseki decidiu pôr fim a esse rito popular anual.

A organização do evento, que atrai centenas de participantes e milhares de turistas todos os anos, tornou-se um fardo pesado para os idosos fiéis locais, que têm dificuldade em manter o rigor do ritual. O festival “Sominsai”, considerado um dos mais estranhos do Japão, é a última tradição a ser afetada pela crise demográfica do país, que atingiu duramente as comunidades rurais.

“É muito difícil organizar um festival desta magnitude”, disse Daigo Fujinami, monge residente do templo inaugurado em 729. “Você pode ver o que aconteceu hoje. Tem tanta gente aqui, e é tudo emocionante, mas nos bastidores há muitos rituais e muito trabalho a fazer”, declarou. “Não posso ignorar a difícil realidade.”

A sociedade japonesa envelheceu mais rapidamente do que a de muitos outros países, uma tendência que forçou o encerramento de escolas e empresas, especialmente em comunidades pequenas ou rurais. O festival Sominsai do Templo Kokuseki costumava ser realizado do sétimo dia do Ano Novo Lunar até a manhã seguinte, mas a pandemia de Covid já havia forçado a redução do evento.

A última comemoração foi uma versão abreviada, que terminou por volta das 23h, mas atraiu a maior multidão de que há memória recente, segundo moradores locais. Ao anoitecer, homens de tanga branca iam ao templo, banhavam-se em um riacho e marchavam ao redor do terreno do templo, cerrando os punhos contra o frio da brisa de inverno enquanto cantavam “jasso Jewela”.

Alguns carregavam pequenas câmeras para filmar sua experiência e dezenas de equipes de televisão os seguiram pelos degraus de pedra e caminhos de terra do templo. Quando o festival atingiu o seu auge, centenas de homens aglomeraram-se dentro do templo de madeira gritando, cantando e lutando para conseguir um saco de talismãs.

Toshiaki Kikuchi, um residente local que adquiriu os talismãs e ajudou a organizar o festival durante anos, disse esperar que o ritual retorne no futuro.

“Mesmo com um formato diferente, espero manter essa tradição”, declarou após o evento.

Muitos participantes e visitantes manifestaram a sua tristeza e compreensão no final do festival.

“Este é o último deste grande festival que durou mil anos. Eu realmente queria participar”, disse à AFP Yasuo Nishimura, um zelador de 49 anos de Osaka.

Outros templos no Japão ainda realizam festivais semelhantes, nos quais os homens vestem tangas e se banham em água gelada ou lutam por talismãs. Alguns adaptam as suas normas à evolução demográfica e social para continuarem a existir, como permitir que as mulheres participem em cerimônias que antes eram exclusivamente masculinas.

No próximo ano, o Templo Kokuseki continuará suas práticas espirituais, mas apenas com cerimônias de oração.

Fonte: O Globo

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