Em discurso sobre o Estado da União, Biden tenta celebrar feitos e expor diferenças com Trump

Congresso dos EUA, onde Joe Biden fará o discurso sobre o Estado da União
Congresso dos EUA, onde Joe Biden fará o discurso sobre o Estado da União — Foto: Anna Moneymaker/Getty Images/AFP

Em alguns minutos, o presidente americano Joe Biden fará seu quarto — e dependendo dos resultados da eleição de novembro, o último — discurso sobre o Estado da União. A fala é uma tradicional prestação de contas ao Congresso e à população, e como normalmente ocorre em anos eleitorais, servirá para que delimite temas de campanha e trace diferenças em relação a seu rival Donald Trump.

Segundo trechos do discurso obtidos pela imprensa americana, o presidente fará uma defesa contundente de sua política econômica, o “Bidenomics”, como aliados a definem. Apesar do ritmo constante de crescimento, recuperando as perdas da economia, e do baixo desemprego, hoje em níveis historicamente baixos, o humor dos americanos com as finanças do país está longe do ideal para o democrata.

A inflação está hoje em níveis controlados — segundo o Fed, a taxa em janeiro foi de 2,4%, em números anualizados —, mas muitos ainda se ressentem dos ainda altos preços dos alimentos e habitação, inclusive em áreas onde os democratas têm bons desempenhos, como em Nova York e Califórnia.

A expectativa é que Biden lembre de seus primeiros dias no cargo, quando assumiu um país ainda sob o impacto humano, social e econômico da Covid-19, que naquele momento ainda estava fora de controle, e como ele conseguiu reverter a grave crise. Vender o Bidenomics como a saída, como o fez em discursos anteriores, parece ser, na opinião de especialistas, o único caminho para começar a mudar opiniões negativas. Segundo o compilado de pesquisas do site Fivethirtyeight, a aprovação média dele é de 38,1%.

A promessa de que a economia melhorará em um eventual segundo mandato, como fazem todos os candidatos à reeleição, também será chave para o sucesso — a tarefa não será simples: segundo uma pesquisa do Wall Street Journal, divulgada no domingo, cerca de 60% dos americanos acreditam que a situação econômica do país piorou nos últimos dois anos, enquanto 31% afirmam que as coisas melhoraram.

Nem só de Bidenomics trata o discurso, que normalmente dura pouco mais de uma hora. O presidente fará um novo apelo aos congressistas para que aceitem seu pacote de políticas migratórias, que integra um plano mais amplo de envio de ajuda militar e financeira a Ucrânia, Israel e aliados na Ásia e Pacífico. Apesar de criticarem o presidente neste setor, que promete ser um dos principais da campanha, os republicanos, que controlam a Câmara, têm se recusado a votar com a Casa Branca.

Segundo analistas, essa postura tem o dedo do próprio Donald Trump, que pretende levar a crise até a eleição para se beneficiar com suas propostas para fechar as fronteiras e deportar estrangeiros em massa. O nome do republicano não aparece no discurso.

Em outro tema sensível, ele vai reiterar o compromisso de restaurar a proteção constitucional ao aborto nos EUA, derrubado por uma decisão da Suprema Corte, em 2022. Vários estados têm adotado medidas que dificultam a interrupção da gestação, e até avançado sobre outros direitos reprodutivos.

— Se os americanos me derem um Congresso que apoie o direito à escolha, eu prometo: vou restaurar Roe vs. Wade como a lei dessa terra novamente — diz trecho antecipado do discurso, trazendo uma referência ao nome do caso que estabeleceu a jurisprudência sobre o tema na Suprema Corte, em 1973.

Ainda sobre Trump, Biden deve destinar um tempo razoável ao reafirmar seu compromisso com a defesa da democracia e das instituições. O republicano tem sinalizado que um eventual retorno à Casa Branca trará mudanças profundas a órgãos como o Departamento de Justiça, e não esconde o desejo de “vingança” contra o que vê como “perseguição política”, se referindo aos seus muitos processos na Justiça. Caberá a Biden se apresentar como a alternativa mais viável para a manutenção das bases democráticas.

O presidente vai mencionar um dos principais pontos de ataque contra sua candidatura à reeleição: sua idade. Aos 81 anos, ele será, caso vença, a pessoa com mais idade a conquistar a reeleição — Trump, por sua vez, tem 78 anos.

— Minha vida me ensinou a abraçar a liberdade e a democracia. Um futuro baseado nestes valores centrais que definiram os EUA: honestidade, dignidade, igualdade. Me ensinou a respeitar a todos. A dar a todos uma chance justa. A não dar um lar ao ódio — dirá o presidente, segundo trechos antecipados pela Casa Branca à CNN. — Agora outras pessoas com minha idade veem uma história: uma história americana de ressentimento, de vingança. Esse não sou eu.

Na política externa, o ponto alto de seu discurso foi antecipado à tarde: a criação de um porto, em Gaza, destinado a facilitar a entrega de ajuda à população palestina em meio a uma grave crise humanitária.

A guerra lançada por Israel ao grupo terrorista Hamas se mostra um calcanhar de aquiles para o democrata, especialmente entre seu eleitorado — em três estados, houve votos de protesto nas primárias do partido, com os votos “não comprometidos”, equivalentes a um voto nulo, atingindo até 30% nas urnas. Do lado de fora da Casa Branca, um pequeno grupo protagoniza um protesto contra o presidente, que não deve fazer um apelo por um cessar-fogo imediato, como muitos esperam.

Segundo assessores, ele está preparado para possíveis vaias e manifestações de oposicionistas dentro do Congresso. No ano passado, ele chegou a responder a algumas das críticas no plenário, mas este ano o presidente da Câmara, o republicano Mike Johnson, disse ter pedido aos seus colegas de Casa que “reduzam a temperatura”. Uma das parlamentares mais vocais e críticas a Biden, Marjorie Taylor Greene, que o vaiou no ano passado, não disse se repetirá a dose este ano. Entre os presentes no plenário da Câmara, chamou a atenção o deputado cassado George Santos, que apesar de ter sido expulso da Casa ainda manteve alguns privilégios dentro do Legislativo.

Fonte: O Globo

© 2024 Blog do Marcos Dantas. Todos os direitos reservados.
Proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo deste site sem prévia autorização.