Em Brasília, Lago Sul tem renda da Espanha; Estrutural, de Bangladesh

Lago Paranoá, desigualdade em Brasília
Mansões na região do Lago Sul (esq.) e pessoas em situação de rua na mesma região (dir.), em Brasília

Prestes a completar 64 anos no domingo (21.abr.2024), a capital federal tem um perfil social marcado por pontos extremos de desigualdade socioeconômica. As cerca de 3 milhões de pessoas que moram no Distrito Federal têm renda que se comparam às principais economias do mundo e, ao mesmo tempo, a nações onde predomina a extrema pobreza.

Enquanto a RA (Região Administrativa) do Lago Sul tem renda domiciliar per capita de R$ 10.979 mensais, um domicílio na região da Estrutural vive com, em média, 6% do que o bairro mais rico tem (R$ 695).

Se fosse um país, o Lago Sul estaria à frente da Coreia do Sul. Já a Estrutural pode ser comparada com a Índia e Bangladesh.

Segundo a arquiteta e urbanista, doutoranda em comunicação e professora da Unesp Bauru, Renata Fakhoury, a ocupação desigual ocorrida em Brasília e nas cidades satélites explica o abismo da renda.

“Com a intensificação dos fluxos migratórios e a consequente explosão territorial, houve uma ocupação irregular, com uma distribuição díspare de saúde, educação, trabalho, dentre outros”, afirmou.

O projeto de Lúcio Costa, urbanista que idealizou a região do Plano Piloto de Brasília, considerava que a cidade abrigaria cerca de 500 mil pessoas até o ano 2000. Em 1970, no entanto, o DF já contava com 546.015 habitantes, superando o total estimado para os 30 anos seguintes à época do planejamento.

Fakhoury explica que além do acesso desigual a serviços, proporcionado pela segregação urbana, o excesso de funcionalismo público é outro fator que contribui para a diferença de renda entre as regiões.

O professor e pesquisador da UFF (Universidade Federal Fluminense), Fernando Mattos, afirma que, em alguma medida, essa é uma característica de todas as capitais do mundo. “Washington (EUA), Berlim (Alemanha) e Londres (Reino Unido) tem essa elite do funcionalismo público com concentração de altas rendas”.

A diferença, segundo Mattos, reside no fato de que, em Brasília, existem os “bolsões de miséria”. Termo usado para se referir a espaços que se formam em regiões metropolitanas e que, por estarem muitas vezes circundados por áreas prósperas, nem sempre aparecem com clareza nas estatísticas municipais ou regionais. Para ele, “a pirâmide é muito esticada. O teto é muito alto e o piso muito baixo”.

Segundo dados do Censo 2022 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a favela do Sol Nascente ultrapassou a Rocinha, no Rio de Janeiro, e se tornou a maior favela do país, com 32.081 casas. Antes de virar região administrativa, o Sol Nascente fazia parte de Ceilândia, região mais populosa do DF criada em 1971 para erradicar favelas na região central da capital federal.

De acordo com dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua de 2021, o Índice de Gini do DF (Distrito Federal) é de 0,566. É a 4ª unidade federativa mais desigual do país. A métrica indica o nível de desigualdade de renda de uma região. Quanto mais próximo de 1, menos desigualdade.

Eis abaixo os 3 Estados mais desiguais:

Entre as regiões de Brasília, a do Riacho Fundo é a que apresenta maior nível de desigualdade de renda, junto com Ceilândia e Arniqueira. Enquanto a menor desigualdade fica com as regiões Sudoeste e de Águas Claras.

Isolado, o índice de Gini não mostra a pobreza de um lugar. “Em um lugar em que a renda domiciliar per capita é baixa, mas o índice não é tão ruim, pode significar que a pobreza está distribuída”, explica o professor Mattos.

O DF, no entanto, desponta no ranking com o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) mais elevado do país: 0,824. É a única unidade federativa do país com índice superior a 0,8.

Além disso, os dados mais recentes do Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil realizado pela Pnud com o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e a FJP (Fundação João Pinheiro) mostram que Brasília é a 9ª cidade brasileira com melhor IDH em 2022.

“A renda conta muito, mas o IDH também é um indicador da qualidade dos serviços como saúde e educação, que geralmente estão ligados à renda”, afirma Mattos.

Segundo a arquiteta, é necessário garantir o direito à cidadania para os habitantes das regiões com menor renda. Para Fakhoury, o acesso a uma estrutura eficiente de serviços públicos precisa se tornar uma política pública perene.

“Essa mudança precisa acontecer para que tenhamos como diminuir essa diferença de estrutura. Em Brasília, as regiões do entorno precisam de uma distribuição mais igual”, afirma.

Fonte: Poder360

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