Desigualdades em competências socioemocionais

O relatório “Competências socioemocionais para uma vida melhor”, divulgado na sexta-feira passada pela OCDE, mostrou, mais uma vez, que habilidades como persistência, autocontrole, responsabilidade, otimismo, tolerância e curiosidade estão positivamente associados ao desempenho escolar, saúde e bem-estar dos estudantes. Não surpreende, mas o estudo – realizado em 16 países – revela também que há significativas disparidades por gênero, nível socioeconômico e idade. O Brasil fez parte do levantamento com a cidade de Sobral (CE), com apoio do Instituto Ayrton Senna.

Uma das constatações é que entre a infância e a adolescência há uma piora nas competências pesquisadas, com jovens de 15 anos reportando terem mais dificuldade em relação a crianças de 10 anos. Outro achado é que, assim como acontece no desempenho em provas (em que o grau de escolaridade e renda dos pais é o fator de maior impacto nas notas), crianças e adolescentes mais pobres apresentam também maiores dificuldades. Entre as diferenças por gênero, aos 15 anos, meninos disseram ter menos dificuldades em relação ao estresse, confiança e sociabilidade. Meninas foram melhor em atitudes como tolerância, empatia e responsabilidade, mas reportaram piores hábitos de saúde, como fazer exercício, dormir bem e tomar café da manhã, além de estarem menos satisfeitas com seu corpo e imagem.

Quando o termo “competências socioemocionais” apareceu no debate educacional, houve questionamentos sobre sua pertinência. Alguns argumentavam que isso sempre esteve no radar de educadores. Outros, em linha oposta, diziam que não caberia aos professores e gestores mais essa preocupação, que tiraria o foco do ensino de disciplinas tradicionais. Mesmo entre os que concordavam com a necessidade de olhar também para essas dimensões, houve – e ainda há – questionamentos sobre a possibilidade de serem avaliadas ou ensinadas na escola. Há ainda receios – legítimos – de que, a depender da abordagem, isso fosse entendido como um treinamento de controle das emoções ou mais uma forma de jogar para alunos e professores a culpa por problemas que são fortemente impactados pelo ambiente externo e condições de trabalho.

Uma das dificuldades de comunicar estratégias ou resultados de competências emocionais é que o termo, por ter se tornado popular, virou polissêmico. E isso se reflete na qualidade dos programas. No ano passado, uma meta-análise (abordagem mais robusta por sintetizar achados de um conjunto maior de evidências) realizada por 14 pesquisadores de universidades americanas encontrou grande variação no resultado de 424 estudos conduzidos em 53 países, com 575 mil estudantes, sobre a eficácia em escolas de intervenções voltadas para o desenvolvimento de competências socioemocionais. Na média, porém, os resultados foram positivos, com melhoria em atitudes, comportamentos, no bem-estar, clima escolar e aprendizagem. O trabalho, liderado por Christina Cipriano (Yale), foi publicado no periódico científico Child Development, de alto impacto e com revisão por pares.

Divergências sobre conceitos, abordagens ou estratégias mais adequadas continuarão existindo nesse tema. O que não se discute é a necessidade de contribuir de alguma forma para que estudantes se sintam mais saudáveis, seguros e preparados para lidar com suas emoções de forma mais positiva.

Fonte: O Globo

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