Descriminalização ou legalização: Entenda a discussão no STF sobre o porte de maconha

O plenário do Supremo Tribunal Federal
O plenário do Supremo Tribunal Federal — Foto: Antonio Augusto/STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quarta-feira o julgamento iniciado em 2015 que discute as regras para o porte de drogas para consumo próprio. A análise volta com o voto do ministro André Mendonça, que pediu vista em agosto de 2023 para examinar o assunto. O caso traz à tona dúvidas sobre a realidade legal da maconha no Brasil atualmente.

Hoje, a Lei de Drogas (nº 11.343, de 2006) proíbe em todo o território nacional o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas, com exceção para aquelas plantas de uso exclusivamente ritualístico religioso e no caso de fins medicinais e científicos.

Desde 2006, de acordo com o artigo 28 da lei, o usuário não é punido com prisão pelo porte e produção de entorpecentes para consumo próprio. Ele sofre apenas advertências sobre os efeitos, deve prestar serviços à comunidade ou cumprir medidas educativas de comparecimento a programas ou cursos educativos. No entanto, não há critérios objetivos que diferenciem porte para consumo próprio para tráfico de drogas, este punido com prisão.

— A conduta do usuário de portar para consumo próprio é julgada dentro de um processo penal. Ao ser eventualmente condenado ele é classificado como um criminoso. Importante notar que o artigo 28 da Lei sobre Drogas está no Capítulo II da Lei, que tem o título “Dos crimes e das penas”. Então, embora não tenha uma pena privativa de liberdade, o artigo 28 tem penas privativas de direitos que são impostas ao usuário flagrado portando drogas — explicou Emílio Figueiredo, advogado na Rede Reforma, coletivo de juristas que combate a atual política de drogas.

Atualmente, essa definição entre consumo próprio e tráfico fica a cargo da polícia, do Ministério Público e do Judiciário, mas a norma é interpretada de formas diversas dependendo do local em que ocorrer o flagrante. Ou seja, pessoas presas com a mesma quantidade de droga e em circunstâncias semelhantes podem tanto ser consideradas usuárias quanto traficantes.

Em 2009 foram encontradas, durante inspeção de rotina, 3 gramas de maconha dentro da cela de Francisco Benedito de Souza, um mecânico que cumpria pena de um ano e dois meses por porte de arma de fogo no Centro de Detenção Provisória de Diadema.

O defensor público Leandro Castro Gomes, responsável pelo caso, alegou inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei Antidrogas, durante a defesa do mecânico, que acabou sofrendo nova condenação, de dois meses de prestação de serviços comunitários.

A criminalização da posse de drogas para consumo pessoal violaria, na opinião de juristas, o art. 5º, X, da Constituição Federal, no qual se prevê que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

O caso de Francisco Benedito de Souza motivou a discussão atual do STF. No entanto, no decorrer do debate sobre a inconstitucionalidade, a discussão no Supremo deslocou o foco para o objetivo de garantir o mesmo tratamento para qualquer pessoa flagrada portando a droga em todo o país. Atualmente, a discussão tramita entre a possibilidade de porte entre 25 a 60 gramas e a plantação de até seis plantas fêmeas. Que estiver dentro desses parâmetros seria considerado usuário pela lei.

— A questão inicial era sobre a constitucionalidade da criminalização das condutas relativas ao porte para consumo próprio, e agora o julgamento está rumando para uma manutenção da ilicitude no âmbito administrativo com uma diferenciação objetiva entre quem porta para consumo próprio e quem porta para difusão ilícita — esclareceu Figueiredo.

O presidente do STF, o ministro Luís Roberto Barroso, que votou a favor do porte, ressaltou que a discussão não se trata de “liberar a maconha”.

— Eu sou contra as drogas e sei que é uma coisa ruim e é papel do Estado combater o uso de drogas ilegais e tratar o usuário — afirmou Barroso — Se um garoto branco, rico e da Zona Sul do Rio é pego com 25g de maconha ele é classificado como usuário e é liberado. No entanto, se a mesma quantidade é encontrada com um garoto preto, pobre e da periferia ele é classificado como traficante e é preso. Isso que temos que combater e o que será julgado no Supremo — afirmou Barroso.

Fonte: O Globo

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