Cotista de Direito processa a USP após perder vaga por não ser considerado pardo pela banca examinadora

Glauco Dalalio do Livramento (ao centro), de 17 anos, entrou com ação judicial contra a USP
Glauco Dalalio do Livramento (ao centro), de 17 anos, entrou com ação judicial contra a USP — Foto: Arquivo pessoal

A família de Glauco Dalalio do Livramento, de 17 anos, entrou com uma ação judicial contra a Universidade de São Paulo (USP), após o jovem ter a matrícula em Direito cancelada por não ter a sua autodeclaração de pardo aceita pela banca examinadora. Para a a defesa do adolescente, que é de Bauru, interior de São Paulo, faltou uma análise presencial para sanar quaisquer dúvidas.

A lei de reserva de vagas por cotas é nacional, mas cada faculdade monta a sua banca examinadora. Para a advogada de Glauco, Alcimar Mondillo, mesmo que a USP tenha diferentes etapas para o exame de heteroidentificação, ela errou ao não incluir uma fase presencial, o que só acontece para os que ingressam na instituição via Fuvest, mas não pelo Enem ou pelo chamado Provão Paulista, caso do jovem.

— A lei de cotas não faz essa diferenciação entre os cotistas — diz Mondillo, acrescentando que a indisponibilidade da análise presencial seria “inconstitucional e ilegal”.

Em nota, a universidade declarou, por nota, que muitos dos candidatos do Enem e do Provão moram em locais distantes, e que por isso privilegia a análise virtual. Ainda assim, a USP argumenta que procura “garantir condições para que candidatos de outras localidades tenham a oportunidade de ingressar” na instituição. Já Mondillo sustenta que os candidatos deveriam ter a escolha de ir presencialmente ou não.

A banca examinadora é um sistema que passou a ser usado em 2023 pela USP, para evitar fraudes em cotas. O parecer elaborado pela comissão diz que Glauco “tem pele clara, boca e lábios afilados, cabelos lisos, não apresentando o conjunto de características fenotípicas de pessoa negra”. Para a advogada, é “evidente” que o rapaz tem pele morena e que seu cabelo é liso por ter ascendência indígena.

— Quando o vi, não tive dúvida de que era pardo — garante Mondillo.

Filho de uma atendente de telemarketing e de um auxiliar de obra da prefeitura, Glauco trabalha como jovem aprendiz. Após saber de sua aprovação, o chefe avisou que iria realizar a sua transferência para uma filial no Centro de São Paulo, pois assim não perderia a verba para investir nos estudos.

— Ajuizamos uma ação e pedimos uma liminar para o juiz garantir a vaga dele e o autorizar a frequentar as aulas. Ele já perdeu uma semana de aulas. Os pais estão esperançosos. O Glauco está bem desapontado, está triste demais — afirmou a advogada.

Na nota, a USP afirmou ainda que “a análise é estritamente fenotípica” e que “a banca não faz nenhum tipo de pergunta sobre a vida dos candidatos”. A nota prossegue: “O que conta mesmo é a cor da pele, os cabelos e a forma da boca e do nariz”.

Este é o segundo caso repercutido sobre as bancas examinadoras da USP em menos de uma semana. Alison dos Santos Rodrigues, de 18 anos, teve sua matrícula em medicina cancelada pela USP após ter sua autodeclaração racial rejeitada. Ele seria o primeiro de sua família a entrar em uma universidade.

(estagiário sob supervisão de Luã Marinatto)

Fonte: O Globo

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