Cidades querem mais financiamento direto, defende grupo de metrópoles do G20

Vista da cidade de São Paulo
Vista da cidade de São Paulo — Foto: Marcos Alves

As maiores cidades do G20, grupo de potências econômicas mundiais, defendem a ampliação do acesso direto de metrópoles ao financiamento de instituições multilaterais para bancar projetos de infraestrutura urbana e fazer frente aos efeitos das mudanças climáticas. Reunidas no U20 (Urban 20), as cidades querem aproveitar a presidência brasileira do grupo para avançar na reforma de organismos como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. Pauta histórica do governo Lula, a reforma das instituições multilaterais ganhou força quando o Brasil assumiu a presidência do G20, em dezembro de 2023.

Um dos 13 grupos de engajamento do G20, o U20 foi fundado em 2017 e é convocado pelo C40, uma rede global de quase 100 cidades para o enfrentamento das mudanças climáticas, e pelo grupo de Cidades e Governos Locais Unidos (CGLU). Sob o guarda-chuva do U20 estão 38 cidades-membros, além de prefeituras convidadas. Fazem parte do grupo — que reúne de Tóquio (Japão) a Amsterdã (Holanda), passando por Nova Délhi (Índia) e Nova York (EUA) — as cidades mais envolvidas nas discussões globais. A liderança é exercida por uma presidência rotativa e neste ano é compartilhada por São Paulo e Rio de Janeiro.

Candidatos à reeleição e de polos políticos opostos, os prefeitos Ricardo Nunes (MDB/SP) e Eduardo Paes (PSD/RJ) irão receber, em junho e novembro, os prefeitos do U20 para reuniões em suas cidades. O encontro na capital fluminense será realizado, pela primeira vez, na véspera da cúpula de líderes do G20, em 18 e 19 de novembro, no Museu de Arte Moderna do Rio.

O U20 fez a primeira reunião, de forma virtual, no começo de março, com os chamados sherpas (negociadores) das cidades. No encontro, foi discutida a proposta temática e houve consenso em torno da pauta de financiamento do desenvolvimento sustentável urbano, relataram participantes ouvidos pelo Valor.

Diretor regional do C40 para América Latina, Ilan Cuperstein destaca que o U20 é, historicamente, alinhado à agenda da presidência do G20. O Brasil estabeleceu para este ciclo três eixos temáticos: o combate à pobreza, o desenvolvimento sustentável e a reforma das instituições multilaterais.

— Em relação ao terceiro ponto, já está muito claro para nós o que diz respeito ao acesso a financiamento para ações urbanas por parte dos governos subnacionais. É algo urgentemente necessário sobretudo para cidades do Sul Global — afirma Cuperstein.

O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, é aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e opositor de Lula (PT). Dentro do U20, no entanto, o município afirma que estará alinhado às prioridades estabelecidas pelo governo federal.

— Há um alinhamento nas necessidades e reivindicações. A questão da injustiça social não é preocupação exclusiva do governo federal, ela é comum a todos os governantes — diz a embaixadora Maria Auxiliadora Figueiredo, secretária-adjunta da Secretaria de Relações Exteriores do município de São Paulo.

O grupo de cidades defende o acesso a investimento direto e mais financiamento público e privado para que os governos locais possam combater as desigualdades, promover a transição climática e energética justa e melhorar a infraestrutura urbana.

— É uma aterrissagem da agenda global para o nível das cidades — diz Cuperstein.

No âmbito federal, o debate sobre o financiamento urbano sustentável se dá em dois grupos de trabalho que integram a trilha econômica do G20: o GT de finanças sustentáveis e o GT de infraestrutura. Este foi responsável por dar enfoque às áreas urbanas no debate global de financiamento à infraestrutura na presidência indiana do G20, anterior à do Brasil.

— Nós temos duas prioridades: a infraestrutura resiliente às mudanças climáticas e o endereçamento de financiamento. São temas que podem contribuir para a mitigação da pobreza. E quando a gente fala desses temas, estamos falando, na maioria dos casos, de infraestrutura urbana, que é onde a maior parte das pessoas vive e onde os problemas de infraestrutura tendem a ser mais agudos — afirma o coordenador brasileiro do GT de Infraestrutura, Marden Barboza.

Para Barboza, o G20 tem capacidade de avançar nas discussões, pois os bancos multilaterais estão mais atentos à questão da sustentabilidade. No caso brasileiro, ele destaca que as cidades podem acessar as linhas de crédito por meio de operações que contam com garantia do governo federal.

— Mas esse dinheiro tem juros altos e demora a chegar devido ao processo burocrático. Dinheiro bom, em quantidade e rápido que vá direto para projetos de grande impacto ambiental ainda não é acessível pelas cidades — rebate o presidente do Comitê Rio G20 e coordenador de Relações Internacionais da prefeitura, Lucas Padilha.

Um estudo de 2023 da Cities Climate Finance Leadership Alliance em colaboração com C40 e o Pacto Global de Prefeitos mostra que, entre 2015 e 2022, apenas 21% do financiamento dos bancos multilaterais de desenvolvimento foram destinados ao financiamento urbano — apesar de o Relatório Mundial das Cidades, publicado pelo ONU-Habitat em 2022, apontar que 68% da população mundial vão viver em cidades até 2050.

Cenário que, para Padilha, ocasionará um aumento da demanda de crédito junto aos organismos multilaterais, já que o mercado não conseguirá financiar sozinho grandes projetos de infraestrutura frente ao recrudescimento das mudanças climáticas. Por outro lado, ele crê que as cidades do Sul Global têm uma oportunidade única de avançar na pauta do financiamento com a presidência brasileira do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, o banco do Brics) e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

Cuperstein acrescenta que um dificultador é a falta de alinhamento a outros níveis de governo. No C40, quase todas as cidades se comprometeram com as metas do Acordo de Paris. Já as metrópoles, sem poder sobre a matriz energética e as políticas nacionais, não conseguem alcançá-las sozinhas.

As metrópoles participantes e observadoras trabalham num documento conjunto, que é submetido à presidência do G20 antes da cúpula de novembro. Antes disso, São Paulo realizará, em 17 e 18 de junho, o primeiro encontro de prefeitos do U20, com eventos pela sustentabilidade. São esperados 38 cidades-membros e 20 convidadas. Em 16 e 17 de novembro, os prefeitos são aguardados no Rio U20 Summit, no G20 Social.

Fonte: O Globo

© 2024 Blog do Marcos Dantas. Todos os direitos reservados.
Proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo deste site sem prévia autorização.