‘Brasil precisa fazer um retrofit das cidades’, diz especialista

Para Andrea, falta planejamento climático nos municípios
Para Andrea, falta planejamento climático nos municípios — Foto: Fotos de Fabio Rossi / Agência O Globo

Adaptar as cidades à emergência climática significa bem mais do que obras. É preciso fazer um retrofit do modo de vida urbano, com mudanças nos transportes, nas construções e até no financiamento de projetos, afirma Andrea Santos, diretora para a América Latina da Rede de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Urbanas (UCCRN, na sigla em inglês), professora do Programa de Engenharia de Transportes da Coppe/UFRJ e secretária do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas. Ela diz que o caminho é longo, mas viável e que algumas medidas podem ser tomadas no curto prazo.

Qual a maior urgência para as cidades?

Tudo é urgente. O clima já mudou. Precisamos mitigar e adaptar ao mesmo tempo. Mas todos os desastres, os extremos de calor, com mortes, perdas de qualidade de vida e econômicas que sofremos, nos mostram o tamanho colossal do nosso atraso. Por isso, a adaptação está no centro de todas as discussões. É urgente, mas viável.

E a mitigação?

Houve avanços em algumas cidades. Mas, em geral, em vez de diminuir, estamos aumentando as emissões urbanas oriundas do consumo de energia, sobretudo, em transportes. É muito difícil, por exemplo, estabelecer de onde vem determinada emissão de um caminhão ou avião que circule entre cidades.

O financiamento de mitigação e adaptação a mudanças climáticas é uma pauta das discussões do G20. Como se poderá avançar?

É preciso inserir sustentabilidade em todos os fluxos financeiros. O financiamento deve focar na transformação transversal. Isso quer dizer que projetos para qualquer tipo de coisa — educação, saúde, obras, segurança, transporte, tecnologia — devem levar em conta o componente climático. Todos precisam incluir sustentabilidade.

As cidades brasileiras têm desenvolvido planejamento climático?

Poucas das nossas cidades investem no planejamento climático, com planos realmente estruturados. O Rio de Janeiro é um exemplo de cidade que fez um plano assim. Mas, como de forma geral, faltam recursos para levar adiante.

A senhora vê fatores de risco em comum entre as cidades?

De todos os extremos, o mais prevalente em quase todo o país são as ondas de calor. É um problema que já nos afeta severamente. O calor é um assassino, um grave problema de saúde pública. Também afeta a economia, reduz produtividade. Impacta a produção de alimentos.

Como podemos nos adaptar a cidades mais quentes?

Existem medidas muito simples, como a criação de pontos de resfriamento, que são de curto prazo. São áreas, nos locais de maior concentração da população, onde as pessoas podem ter acesso à água e a ambientes mais frescos. Isso faz muita diferença. É bom para todos, mas tem maior impacto ainda para quem passa horas no deslocamento de casa para o trabalho e vive em habitações precárias, pequenas, sem ventilação e acesso à refrigeração.

O que podemos mudar nos transportes?

Quando se fala em adaptação urbana, os transportes são fundamentais. Em geral pensamos neles como emissores de CO2. Claro que são. Mas também são fundamentais na adaptação. É inconcebível que ainda tenhamos trens ou ônibus operando sem ar-condicionado.

Mas existem adaptações que exigem mudanças bem mais profundas, não?

Claro. O Brasil precisa fazer o retrofit de suas cidades para se adaptar ao clima. Precisamos de novos códigos de obras e construção. São mudanças nos locais, no tipo de construção e nos projetos e materiais.

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Fonte: O Globo

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