Associação diz que governo trata agências reguladoras com “descaso”

Fachada da sede da ANM (Agência Nacional de Mineração), em Brasília (DF)
Funcionários de agências reguladoras intensificaram ameaça de greve geral na semana passada; na foto, prédio da ANM (Agência Nacional de Mineração) em Brasília

A Logística Brasil –associação que representa as empresas de transporte usuárias dos portos brasileiros– produziu um ofício endereçado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), membros do alto escalão do governo federal e líderes do Congresso Nacional em que afirma que as agências reguladoras têm sido negligenciadas nos últimos anos. Leia a íntegra do ofício (PDF – 3 MB).

No documento, a associação diz que o Brasil passa por um momento de sucateamento das autarquias responsáveis pela regulação dos mais importantes setores econômicos do país. Para a associação, o governo não tem tratado os pleitos dos funcionários das agências por reestruturação da carreira com a devida seriedade.

O impacto de um esvaziamento de profissionais técnicos, segundo a associação, trará resultados catastróficos ao país e às ambições brasileiras de adentrar a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).

Os funcionários técnicos das agências estão em vias de aprovar uma greve geral. A demanda é por uma equiparação dos salários e das carreiras dentro das agências reguladoras com a de outros órgãos públicos, como o TCU (Tribunal de Contas da União), o BC (Banco Central) e demais entidades de gestão pública.

Segundo o Sinagências –sindicato que representa os funcionários das agências reguladoras no Brasil–, a remuneração no final de carreira dos cargos das agências é inferior ou, no máximo, próxima à remuneração inicial dos cargos de outras carreiras típicas de Estado.

“O governo federal delegou as negociações para uma mesa que não reconhece devidamente o árduo trabalho de mais de 11.000 servidores, e trata-os com desrespeito e descaso, afastando-os do recebimento de salários condizentes com a importância e necessidade de suas carreiras”, diz o ofício.

Em conversa com o Poder360, o diretor-presidente da Logística Brasil, André Seixas, afirmou que esse cenário de desvalorização das carreiras nas agências resulta em uma “fuga de cérebros” nas autarquias.

Ele explicou que as funções técnicas exigem uma longa curva de aprendizado que acaba sendo interrompida com a ida desses profissionais para outros cargos a fim de ganhar um salário melhor.

De acordo com o Sinagências, as agências reguladoras federais já perderam mais de 3.800 funcionários, o equivalente a 1 funcionário por dia útil desde 2008, o que ocasionou uma perda significativa de força de trabalho e expertise.

Para Seixas, esse cenário é fruto de um desinteresse do Congresso Nacional em fortalecer a regulação federal. Ele afirmou que o país ainda não possui uma cultura de regulação federal porque muitas vezes o corpo técnico de uma agência contraria os interesses de grupos políticos.

Na visão de Seixas, a lógica por trás de um sucateamento das agências reguladoras é a seguinte: políticos indicam os diretores das agências, que são os responsáveis pela deliberação das decisões regulatórias.

Essas decisões são tomadas com base em documentos técnicos como AIRs (Análises de Impacto Regulatório) e ARRs (Análise de Resultado Regulatório) que são produzidos pelos funcionários das áreas técnicas das autarquias. Contudo, os diretores podem se esquivar dos documentos técnicos para impor uma agenda mais alinhada a seu grupo político.

Com diretores apadrinhados, os políticos tentam influenciar decisões nas agências, mas com um documento técnico bem-produzido, uma associação ou empresa que se sinta prejudicada por uma decisão da diretoria pode questionar o resultado.

Nesse cenário, um quadro de técnicos esvaziado e inexperiente facilita que decisões políticas prevaleçam sobre critérios técnicos. “Um corpo técnico robusto derruba uma decisão política”, disse Seixas.

Sem um ambiente regulatório robusto e a possibilidade iminente de uma greve geral na regulação federal, a Logística Brasil estima que a agenda econômica brasileira ficará travada e os interesses de corporações ficarão acima do interesse público.

Além disso, se a regulação brasileira não estiver de acordo com os parâmetros internacionais de qualidade, o país conviverá com uma grave insegurança no aporte de investimento, além de ficar distantes dos patamares exigidos de regulação para entrar na OCDE.

Seixas também apontou que o fortalecimento das agências é um caminho para aumentar a arrecadação federal. No ofício, a Logística Brasil afirmou que as agências reguladoras são responsáveis pela regulação de mais de 60% do PIB brasileiro e, somente em 2023, foram arrecadados mais de R$ 87 bilhões em atividades decorrentes da regulação setorial.

Ou seja, mesmo com um quadro defasado, as autarquias contribuíram para uma arrecadação imponente. “Regulação não é gasto, é investimento”, disse Seixas.

Fonte: Poder360

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