Acusada de segregar alunos bolsistas dos pagantes, escola particular de elite em SP vira alvo de ação na Justiça

Colégio Visconde de Porto Seguro, em SP, é acusado de segregar alunos bolsistas de pagantes
Colégio Visconde de Porto Seguro, em SP, é acusado de segregar alunos bolsistas de pagantes — Foto: Divulgação

O Colégio Visconde de Porto Seguro, em São Paulo, tornou-se alvo de uma ação civil pública protocolada na Justiça nesta segunda-feira por supostamente diferenciar o tratamento de alunos cotistas e pagantes. De acordo com a Educafro Brasil e a Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (Anced), entidades que ingressaram com o processo, os bolsistas são colocados “em unidades com pior estrutura”, sendo proibidos de ingressar nas dependências destinadas aos pagantes “sem autorização prévia”, e têm “grades curriculares diferentes”.

Fundado há quase 150 anos, o Colégio Visconde de Porto Seguro é um dos mais tradicionais de São Paulo. A principal unidade fica no Morumbi, bairro nobre da capital paulista. Por nota, a instituição afirma que “tem como premissa” atuar “na promoção da equidade para toda a comunidade escolar” e que “acolhe, há mais de 60 anos, estudantes bolsistas provenientes de famílias de baixa renda”. “Não há qualquer discriminação ou diferença de tratamento dos alunos, sendo oferecida em todos os quatro campi do Colégio uma proposta pedagógica de excelência reconhecida internacionalmente, com qualificado corpo docente”, acrescenta a escola — veja a íntegra do texto ao fim da reportagem.

Beneficiado pela Lei da Filantropia, o colégio é obrigado, pelas regras estabelecidas, a oferecer cerca de 16% de suas vagas na forma de bolsas de estudos em troca de isenção tributária. Na Ação Civil Pública, a Educafro e a Anced pedem pagamento de indenização por danos morais coletivos, por conta do suposto tratamento diferenciado a esses alunos, além da adoção de medidas de promoção da equidade racial e social.

Os relatos de segregação, de acordo com as duas entidades, partem de bolsistas das cinco unidades do colégio, que somam 17% do total de estudantes. Os alunos afirmam, por exemplo, que eventos tradicionais, como festas juninas, são realizados em horários diferentes, para que pagantes e cotistas não compartilhem o mesmo ambiente, além de não terem acesso ao Currículo Bilíngue e ao Currículo Internacional — duas opções ofertadas para os estudantes que pagam mensalidade. A Educafro e a Anced chegam a afirmar, na ação, os bolsistas “”ficam submetidos a um verdadeiro apartheid”.

Ao GLOBO, o diretor executivo da Educafro, Frei David Santos, relatou que o Colégio Visconde de Porto Seguro foi procurado quatro vezes para firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), mas negou a medida. Segundo Santos, ao ser questionada sobre o motivo da segregação, a escola teria respondido que era para proteger os alunos bolsistas de possíveis constrangimentos que pudessem surgir devido à disparidade social:

— Os alunos vieram nos pedir socorro. Quando procurada, a escola negou o acordo do TAC para não prejudicar a filantropia. A conduta discriminatória perpetrada pelo colégio viola a Constituição e boa parte dos pactos e convenções internacionais sobre direitos humanos e combate ao racismo — pontua Frei David.

Em 2022, estudantes da unidade de Valinhos (SP) da rede foram alvo de uma denúncia de discriminação. Um adolescente negro, de 15 anos, passou a sofrer ofensas racistas após criticar um grupo de WhatsApp que disseminava mensagens de cunho nazista, homofóbico, xenofóbico, racista e misógino. O grupo era formado por mais de 30 participantes, todos alunos da escola, que se autointitulavam “neonazistas do Porto”, ainda de acordo com a Educafro.

O episódio rendeu a expulsão de oito estudantes. À época, a escola lamentou o ocorrido e manifestou indignação com o “conteúdo de caráter racista, antissemita e misógino de algumas dessas mensagens”. “Reforçamos nosso repúdio veemente a toda e qualquer forma de discriminação e preconceito, os quais afetam diretamente nossos valores fundamentais”, declarou.

O crime também chegou a ser denunciado à Polícia Civil de São Paulo pela mãe da vítima, a advogada Thaís Cremasco. Uma das mensagens recebidas pelo jovem foi: “Espero que você morra FDP negro”.

Em outro conteúdo a que a advogada teve acesso, um aluno sugeria “a fundação dos pró-reescravização do Nordeste”. Os integrantes do grupo ainda compartilhavam stickers vangloriando Adolf Hitler, além de mensagens como “não encontro um petista comemorando, acho que é porque eles não têm celular ainda” e “quero que os nordestinos morram de sede”.

“O Colégio Visconde de Porto Seguro tem como premissa ser uma escola que atua na promoção da equidade para toda a comunidade escolar e acolhe, há mais de 60 anos, estudantes bolsistas provenientes de famílias de baixa renda.

Não há qualquer discriminação ou diferença de tratamento dos alunos, sendo oferecida em todos os quatro campi do colégio uma proposta pedagógica de excelência reconhecida internacionalmente, com qualificado corpo docente. Todos os alunos contam com uma jornada de aprendizado moderna, diversificada e multicultural baseada em: conceitos fundamentais de cada área do saber, habilidades e competências; idiomas inglês e alemão; conexões globais; sustentabilidade; inteligência socioemocional e educação digital.

O colégio mantém atividades voltadas para a comunidade em dois campi, oferecendo ensino regular e Educação para Jovens e Adultos. Nossos estudantes bolsistas contam com instalações modernas e seguras, como Lab Maker, estúdios para aulas de música e dança, teatro com equipamentos de última geração, biblioteca, área de esportes e demais ambientes que auxiliam na formação integral dos alunos. Além de contar com corpo docente altamente qualificado, eles também recebem gratuitamente uniforme, lanche nos intervalos, material didático e livros paradidáticos.

Para orgulho de todos, os estudantes bolsistas do Porto Seguro têm se destacado com aprovações em universidades públicas e particulares de ponta, no Brasil e no exterior. Em 2023, 177 aprovações em vestibulares de universidades públicas (30) e privadas (143) no Brasil e no exterior (4), como a Universidade Helios Klinikun Bonn/Rhein-Sieg, na Alemanha. Entre esses alunos, 82 receberam bolsas de estudo, sendo 67 integrais para cursar a faculdade. Para fechar esse ciclo, a média da nota desses estudantes bolsistas em redação no Exame Nacional do Ensino Médio de 2023 foi de 805,7 pontos, resultado que excede a média nacional de 641,6 pontos no exame.

Nesse sentido, o Colégio reitera o compromisso de atuar para a formação acadêmica de excelência de todos os alunos, pagantes ou bolsistas, sempre pautado pela ética, integridade e sem qualquer distinção.”

Fonte: O Globo

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