Acusada de não apoiar advogada que denunciou conselheiro por estupro, OAB-SE faz pesquisa para medir impacto do caso

O advogado Ricardo Almeida, indiciado por estupro, e a vítima Bruna Hollanda, que denunciou suposto descaso da OAB-SE nas redes
O advogado Ricardo Almeida, indiciado por estupro, e a vítima Bruna Hollanda, que denunciou suposto descaso da OAB-SE nas redes — Foto: Fotos de reprodução

As acusações de estupro contra o advogado Ricardo Almeida, feitas pela também advogada Bruna Hollanda, abriram uma crise na seccional do Sergipe da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SE), onde os dois profissionais atuavam como conselheiros. Após o caso vir à tona, Almeida foi afastado do posto, e Hollanda pediu desligamento sob a justificativa de ter se sentido pouco acolhida pela diretoria da entidade ao denunciar a agressão sexual. Nesta quinta-feira, com a conclusão do inquérito, a Polícia Civil sergipana indiciou Almeida pelo crime de estupro.

A OAB-SE sustenta que tomou “todas as providências que estavam ao seu alcance” e que agiu “de forma imparcial, célere e efetiva”. Enquanto a vítima tecia críticas à postura do presidente Danniel Alves Costa, porém, o órgão — que passará por eleições internas em breve — encomendava uma pesquisa de opinião para mensurar o impacto do imbróglio.

A gravação de uma ligação para o levantamento foi divulgada no X (antigo Twitter) pela jornalista Gleice Queiroz, que falou numa “falta de empatia que nos esmaga” ao relatar o ocorrido. “Estupro envolvendo dois conselheiros da OAB. As ações adotadas pela ordem, de afastar o conselheiro acusado, determinar a instauração de um processo ético e de oferecer serviços de acolhimento à vítima… A senhora considera que elas foram acertadas, exageradas, brandas, insatisfatórias, desnecessárias ou não sabe?”, diz a voz feminina responsável pela pesquisa no áudio compartilhado por Queiroz.

Hollanda acredita que o teor do telefonema tem o objetivo de angariar repercussão positiva para o atual presidente na disputa pela reeleição. Já a OAB-SE argumenta que o objetivo da pesquisa é “avaliar a atuação futura” da entidade e “obter informações preciosas para o aprimoramento dos protocolos”. Segundo o órgão, outras 12 perguntas sem relação com o caso foram feitas nas ligações.

“Em contrapartida, apenas a última pergunta teve o objetivo de avaliar a atuação futura da Ordem e obter informações preciosas para o aprimoramento dos protocolos a serem verificados em casos dessa natureza, além do aperfeiçoamento da política institucional de defesa dos direitos das mulheres, especialmente no combate aos crimes sexuais”, pontua a nota enviada pela OAB-SE.

Bruna também relata que Costa Alves apagou uma mensagem com a carta-renúncia elaborada por ela em um grupo com advogados no WhatsApp. Em seguida, a profissional teria sido removida pelo presidente da OAB-SE.

“Na conversa que tivemos no gabinete da presidência da OAB-SE, confesso que senti frieza, cálculo, pendor de vossa excelência. Percebi que não estava diante do presidente da OAB, e sim do sócio e amigo do meu abusador”, reclamava Hollanda em um trecho da carta-renúncia.

Na postagem na qual denunciou o caso e anunciou a saída do posto de conselheira, a advogada diz, em vídeo, que se sentiu “absolutamente desamparada e humilhada pela gestão conduzida por vossa excelência”, em mais uma referência a Danniel Alves Costa. Segundo a advogada, Costa e Almeida são amigos íntimos, o que teria feito o presidente da OAB-SE agir com parcialidade diante das acusações.

A OAB-SE, por sua vez, argumenta, por nota, que logo após ser apresentada a representação da advogada, foi “declarada espontaneamente a suspeição” do presidente e da vice-presidente, e que o processo passou a ser conduzido pelo secretário-geral da seccional. De acordo com a entidade, o responsável pela apuração “tomou todas as providências de forma imparcial, célere e efetiva”.

A seccional sergipana da OAB declarou também que seu presidente não demonstrou postura favorável a nenhuma das partes. Alves Costa teria ainda, segundo essa versão, feito quase 40 contatos com a advogada para prestar acolhimento. A OAB-SE informa que Almeida foi afastado do posto de conselheiro em 19 de fevereiro, primeiro dia útil após a apresentação da denúncia, no dia 16 do mesmo mês.

“A OAB-SE tomou todas as providências que estavam ao seu alcance: instaurou o processo ético-disciplinar, afastou o advogado das suas funções e disponibilizou todo o acolhimento à vítima”, acrescenta a nota. “A OAB Sergipe compreende e se solidariza plenamente com a dor e com o difícil momento que a colega advogada está vivenciando, sendo certo que nada que a Ordem venha a fazer será capaz de cicatrizar esse sentimento”, conclui a entidade.

Bruna narra ter sido agredida sexualmente por Almeida no fim de janeiro, após um bloco de pré-carnaval. Segundo a advogada, ele ofereceu uma carona depois do evento, mas desviou o caminho para sua própria casa, alegando que precisava tomar banho. Ela afirma que confiava no advogado pois mantinham uma relação amigável e, por isso, não estranhou a mudança de trajeto.

Já na casa do colega, porém, Almeida teria “mudado totalmente” de comportamento, passando a atacar fisicamente a advogada. Em seguida, conta Bruna, ele a estuprou.

— Eu não acreditava no que estava presenciando. Diversas vezes eu pedi para ele parar — lembra.

De acordo com a Secretaria de Segurança Pública do Sergipe, o inquérito aberto no Departamento de Atendimento aos Grupos Vulneráveis (DAGV) corroborou o relato da vítima e foi concluído com o indiciamento de Almeida. Contudo, o advogado Guilherme Maluf, que representa o conselheiro afastado da OAB, contesta a versão de Bruna e sustenta que encontrou diversas contradições no depoimento dela.

— Estou muito convencido (da inocência de Almeida) — frisou.

Maluf preferiu não detalhar a versão do cliente e reclamou do fato de o sigilo do inquérito não ter sido respeitado. Ele conversou com O GLOBO antes do indiciamento de Almeida pela Polícia Civil. Procurado novamente, não retornou os contatos até a publicação desta reportagem.

*estagiária sob supervisão de Luã Marinatto

Fonte: O Globo

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