O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli inaugurou entendimento nesta 5ª feira (20.jun.2024) durante o julgamento sobre a descriminalização do porte de drogas para uso pessoal. A análise será retomada na sessão de 3ª feira (25.jun).
O ministro entendeu que se deve seguir a lei vigente que criminaliza o porte de drogas, contudo, disse não haver sanções penais que punem o usuário. Portanto, seguiriam valendo as medidas socioeducativas estabelecidas.
Até o momento, há 5 votos favoráveis, 3 contra e 1novo entendimento. Eis o placar:
A ação julgada pela Corte questiona um dispositivo (artigo 28) da Lei das Drogas (11.343 de 2006), que trata sobre o transporte e o armazenamento para uso pessoal. O entendimento firmado servirá de base para julgamentos semelhantes.
Além da descriminalização, o Supremo discute os requisitos para diferenciar uso pessoal de tráfico de drogas. Atualmente, a Lei de Drogas determina que a definição fica a critério do juiz.
O julgamento foi retomado com o voto de Toffoli depois de o magistrado pedir de vista (mais tempo para análise) na última sessão, em 6 de março deste ano.
Toffoli votou nesta 5ª feira (20.jun) pela constitucionalidade do artigo 28 e negou provimento ao recurso em questão. Também reconheceu que a aplicação das medidas previstas nos incisos 1 a 3 no dispositivo não acarreta nenhum efeito penal.
O ministro citou algumas correntes de pensamento que estabelecem que, se não há sanção penal como retenção ou reclusão, não há crime. Por isso, a inclusão das medidas educativas e sociais na lei indica intenção de tratar o usuário sob uma ótica diferente da criminalização.
“A manutenção de um juízo de reprovação da conduta não implica necessariamente em criminalização, mas pode ser vista como uma medida administrativa ou cível“, disse no voto.
As penas previstas para o usuário (tema julgado) são brandas: 1) advertência sobre os efeitos, 2) serviços comunitários e 3) medida educativa de comparecimento a programa ou curso sobre uso de drogas.
Para ele, a estipulação de medidas administrativas e educativas, em vez de penas criminais, é uma forma mais eficaz de abordar a questão do uso de drogas, pois foca na reabilitação e na reintegração social dos usuários.
Toffoli citou ainda uma suposta omissão do Legislativo em não descrever os ilícitos na norma penal. Contudo, entendeu ser legítima a opção do legislador de estabelecer as “medidas sancionatórias tendentes a coibir o porte indiscriminado de drogas, mesmo para consumo pessoal”.
O magistrado já havia afirmado em 6 março que a definição de critérios para diferenciar o uso pessoal de tráfico deveria ser do Legislativo e do Executivo por meio de agências reguladoras.
“Não tenho dúvida de que a lei e especificamente o artigo 28 foi editada com o objetivo de educar os usuários de drogas, tratar os dependentes e punir severamente, por outro lado, os traficantes”, disse.
Ao final de seu voto, fez um apelo ao Legislativo e ao Executivo para que aprimorem políticas públicas sobre o tratamento do usuário de drogas e para que, no prazo de 18 meses, tratem a ausência de critérios objetivos que diferenciem usuário e traficante.Para Toffoli, deve ser dado tempo ao legislador e às políticas públicas do Poder Executivo para solucionar a questão.
Toffoli disse ainda que definir um número de gramas não coíbe o problema da “subjetividade” em prisões.
Eis os critérios que haviam sido definidos por cada ministro:
Segundo dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), há pelo menos 6.300 processos do tema em instâncias inferiores da Justiça aguardando decisão.
Para o presidente do Supremo, ministro Roberto Barroso, o intuito é evitar a discriminação entre ricos e pobres e, mais especificamente, entre brancos e negros, para que o “critério aleatório” não seja usado por policiais.
No início da sessão, Barroso também disse que o julgamento não trata da legalização das drogas, mas só transfere o entendimento do âmbito penal para a natureza administrativa.A única consequência prática seria incluir prestação de serviços à comunidade.
André Mendonça, que votou contra a descriminalização, afirmou que o STF está “passando por cima do legislador” em continuar com a maioria favorável.
Para Toffoli, entretanto, “não há nenhum gesto do Tribunal em direção à liberação de qualquer tipo de drogas ou entorpecentes, nem mesmo nenhuma espécie de avanço indevido sobre as competências do Congresso Nacional”.
A análise do tema foi um dos pontos primordiais para a crise instaurada entre Legislativo e Judiciário. A decisão vem de encontro com a PEC sobre Drogas (45 de 2023) aprovada pelo Senado e pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara dos Deputados.
A PEC insere no artigo 5º da Constituição a determinação de que é crime a posse ou porte de qualquer quantidade de droga ou entorpecente.
O texto recebeu 47 votos a favor e 17 contra. Ainda precisa passar por comissão especial, mas é uma resposta ao julgamento em curso.
O entendimento do STF ao julgar a questão se baseia em uma omissão do Congresso em diferenciar a situação de porte e tráfico.
Os senadores incluíram no texto um trecho para diferenciar usuário de traficante. No entanto, não há critérios claros de como seria feita a diferenciação, o que é alvo de críticas de congressistas contrários à proposta.
O julgamento começou em 2015, mas ficou paralisado por pedido de vista do então ministro Teori Zavascki, que morreu em um acidente aéreo em 2017. Ao assumir o lugar deixado por Teori, Moraes herdou o caso e o liberou para votação em novembro de 2018. Agora, o julgamento está sob a relatoria de Gilmar Mendes.
O debate no STF tem como base um recurso apresentado em 2011 pela Defensoria Pública. O órgão questiona uma decisão da Justiça de São Paulo, que condenou um homem pego em flagrante com 3 gramas de maconha. Ele estava preso no Centro de Detenção Provisória de Diadema, na região metropolitana da capital paulista.
Os ministros não tratam do tráfico de drogas, que tem pena de 5 a 20 anos de prisão e permanecerá ilegal.
Esta reportagem foi escrita pela estagiária de jornalismo Bruna Aragão sob a supervisão da editora-assistente Isadora Albernaz.
Fonte: Poder360