Polícia de SP acha quase R$ 3 bilhões ligados a crime organizado e aponta ‘mudança de perfil’ na lavagem de dinheiro; entenda

A Polícia Civil de São Paulo identificou, até outubro deste ano, R$ 2,9 bilhões com indícios de procedência ilícita. O montante é decorrente de investigações do Laboratório de Tecnologia Contra Lavagem de Dinheiro (LAB-LD), considerado o “cérebro financeiro” de apurações contra grupos acusados de lavagem de dinheiro e ocultação de patrimônio.
O laboratório fica no recém-inaugurado 18º andar do Palácio da Polícia Civil, no Centro da capital paulista, e reúne quase 40 analistas de inteligência financeira. Por razões de segurança, eles têm as identidades preservadas.
De acordo com a Polícia Civil, em dez meses de trabalho, foram analisados 792 alvos — em grande parte, organizações criminosas. No total, 50 mil contas bancárias passaram por apuração da inteligência financeira. Quatro em cada dez alvos identificados como de “procedência duvidosa” estão ligados aos crimes de estelionato. O tráfico de drogas vem logo depois, com 35%, seguido pelos delitos de furto qualificado e crime contra a economia popular, com 10% cada.
Segundo a Polícia Civil paulista, houve uma mudança de perfil nos crimes envolvendo lavagem de dinheiro. No ano passado, um terço do valor analisado (R$ 1,5 bilhão) para este crime tinha a ver com o delito do tráfico de drogas. Outros 26% eram ligados a estelionato.
Os analistas do centro de inteligência agora tentam desvendar o por quê da mudança. Num primeiro momento, os especialistas acreditam que a explicação está vinculada ao período da pandemia de Covid-19. Naquele momento, crimes praticados por meios digitais dispararam no país. Com isso, investigações sobre criminosos, contas e estruturas financeiras dessas quadrilhas ganharam força.
O aumento nos registros, para a Polícia Civil, “decorre da facilidade que o criminoso tem de praticar um golpe, seja virtual ou presencial”. Além disso, os crimes de estelionato representam menor risco de prisão, já que dificilmente há um contato pessoal que permita a identificação do suspeito.
Ainda de acordo com a Polícia Civil, as análises do Laboratório de Tecnologia Contra Lavagem de Dinheiro (LAB-LD) são feitas a partir de pedidos de delegados. Ao identificarem alguma suspeita de enriquecimento ilícito ou ocultação de patrimônio, os chefes de sedes policiais acionam o laboratório.
A Justiça precisa autorizar a quebra do sigilo dos dados financeiros dos alvos. Depois disso, os analistas passam a “seguir” o dinheiro para tentar descobrir de onde ele vem e entregam os resultados aos investigadores.
“Um dos critérios do relatório é identificar as tipologias de lavagem de dinheiro, os atos de lavagem de dinheiro, que são dinâmicos. A gente tem essa preocupação de procurar o que os criminosos fazem para ocultar ou dissimular a origem dos bens e valores adquiridos com crimes antecedentes”, explicou um dos analistas, que preferiu não ser identificado.
O desafio dos analistas é apurar como as organizações criminosas se valem de meios “legais” para lavar o dinheiro obtido no cometimento de crimes como tráfico de drogas e estelionato. A apuração também visa a identificar como os recursos foram utilizados para financiar as organizações criminosas no estado de São Paulo e também fora do país.
A Polícia Civil aponta que “a espinha dorsal” do trabalho de investigação da origem dos recursos é o SIMBA — um “conjunto de processos, módulos e normas para tráfego de dados bancários entre instituições financeiras e órgãos governamentais, desenvolvido e disponibilizado pelo Ministério Público Federal através de acordo de cooperação técnica”.
Cada estado pode solicitar registros, que são então transferidos para a instância local do sistema na forma de relatórios, garantindo a confidencialidade dos dados.
Fonte: O Globo