Morto em invasão do bando de Lampião a Mossoró, cangaceiro Jararaca tem túmulo visitado todos os anos no Dia de Finados
José Leite de Santana virou ‘santo popular’ e tem milagres atribuídos a ele no Oeste potiguar.
“Jararaca” virou santo popular. O cangaceiro José Leite de Santana, que foi preso durante a invasão do bando de Lampião a Mossoró, em 1927, morreu e foi sepultado na cidade, tem seu túmulo visitado anualmente por centenas de pessoas, principalmente no Dia de Finados, celebrado nesta quarta-feira (2).
Velas são acesas e flores são deixadas sobre o túmulo. Alguns moradores da cidade do Oeste potiguar atribuem milagres ao cangaceiro. Outros rezam pela salvação da alma do homem.
A dona de casa Maria José foi uma das pessoas que visitou o túmulo de Jararaca no cemitério São Sebastião, o mais antigo da cidade, na manhã desta quarta (2). Essa foi a primeira vez que ela foi ao local, para rezar pela alma do cangaceiro.
“Estou emocionada. Vim por causa da história do bando de Lampião. Acredito em milagres e que ele se arrependeu do que fez, dos pecados. Eu acredito que ele está salvo, que Deus precisa dessas almas assim mesmo. Pela história, como enterraram ele vivo, como a gente ouvia dos nossos avós quando era criança, acho que ele esteja salvo. Eu vim rezar por ele também. Isso faz parte, não é? A gente que é católico reza pelas almas do purgatório”, relatou.
Para o professor de história, Tales Augusto, a “devoção” ao cangaceiro começou após a história da expulsão do bando de Lampião passar a ser mais valorizada culturalmente no município. O fato é lembrado anualmente em intervenções artísticas como o espetáculo Chuva de Balas no País de Mossoró. A cidade também tem um memorial para visitação pública, que relata o acontecimento.
“A história dos cangaceiros, a história de Jararaca, a história da resistência ao bando em Mossoró é uma simbiose. No momento que começou a ter uma valorização daqueles que expulsaram o bando de Lampião, surgiu também a figura de Jararaca. Dizem que ele foi enterrado vivo. Embora suspeite-se que não, mas criou-se esse mito tão forte que as pessoas até hoje valorizam”, conta.
“Quando falamos de santidade popular, estamos falando de pessoas consideradas santas pelo povo, não necessariamente canonizadas pela Igreja. A fé é algo que não se explica. Mas há um sentimento de valorizar aquela pessoa, com quem as pessoas se identificam. Bandido ou herói? Demônio ou santo? Daí vem a fé popular”, diz.
Invasão e resistência
Mossoró era uma cidade com pouco mais de 20 mil habitantes – uma cidade grande para a época. Tinha até uma agência do Banco do Brasil – a número 036.
De acordo com os pesquisadores, bandos de cangaceiros geralmente não invadiam cidades deste porte. Porém, um fazendeiro que acoitava cangaceiros em suas terras no Ceará, próximo à divisa com Mossoró, ordenou um ataque de Massilon, um cangaceiro que tinha um grupo pequeno, contra inimigos em Apodi, no interior do Rio Grande do Norte.
O sucesso no saque à cidade teria despertado a cobiça por Mossoró, segundo o relato histórico. Dessa forma, os cangaceiros partiram para convencer Lampião, que não conhecia muito as terras do Rio Grande do Norte, a fazer um ataque conjunto também com o bando de Jararaca.
Uma semana antes do ataque, o grupo com dezenas de cangaceiros entrou no Rio Grande do Norte pela região de Luis Gomes, no Alto Oeste, e arrasou oito municípios por onde passou, até chegar, no dia 12 de junho, a São Sebastião, onde hoje é a cidade de Governador Dix-Sept Rosado. Ainda de acordo com os historiadores, o telégrafo ainda conseguiu enviar uma mensagem a Mossoró, avisando do ataque iminente.
Ao longo do dia, a cidade foi sendo esvaziada, com famílias pegando trem para deixar Mossoró e um grupo de resistência com mais de uma centena de homens começou a se preparar para o ataque. Segundo os estudiosos, era final da tarde do dia 13 quando o bando começou a percorrer as ruas vazias e deu início a uma troca tiros. O confronto durou cerca de duas horas.