‘Coreia do Sul é a fonte de tensão e instabilidade’ na Península Coreana, afirma porta-voz da Chancelaria russa

Manifestantes participam de vigília pedindo a renúncia do presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk-yeok, em Seul
Manifestantes participam de vigília pedindo a renúncia do presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk-yeok, em Seul — Foto: ANTHONY WALLACE / AFP

A porta-voz da Chancelaria russa, Maria Zakharova, apertou o tom das críticas ao governo da Coreia do Sul, dois dias depois da decretação da lei marcial pelo presidente Yoon Suk-yeol, revertida pelo Parlamento horas depois e que pode levar ao seu impeachment. Para Zakharova, o episódio de terça-feira “deixou claro que é a Coreia do Sul a fonte de tensão e instabilidade na Península Coreana”.

Em entrevista ao Canal 1 da Rússia, Zakharova afirmou que “não existe nenhuma presidência concluída normalmente” na Coreia do Sul, e disse que a crise no país está “totalmente integrada” ao que chamou de ambiente político criado pelos EUA. Para ela, as intempéries em Seul ajudam a explicar a militarização conduzida pelo governo da Coreia do Norte, com quem Moscou tem ampliado seus laços, especialmente no setor de Defesa.

— Se observarmos a situação não de forma pontual, mas sim no cenário mais amplo, fica claro por que a Coreia do Norte está aumentando de forma tão acelerada para fortalecer a sua própria segurança — afirmou Zakharova. — Seu vizinho, a Coreia do Sul, é absolutamente imprevisível. Ou melhor dizendo, sua imprevisibilidade já é previsível.

Na terça-feira, em uma série de eventos sem precedentes desde a redemocratização do país, nos anos 1980, o presidente Yoon Suk-yeol declarou lei marcial na Coreia do Sul, citando ameaças internas supostamente ligadas à Coreia do Norte. Na prática, o impopular líder viu na manobra uma forma de conter o Parlamento, dominado pela oposição e que lhe impõe derrotas recorrentes desde o início do mandato, em 2022. Os militares chegaram a entrar na Assembleia Nacional, mas não impediram a derrubada do decreto pelos deputados, da oposição e de governistas.

No sábado, Yoon será submetido a uma votação que poderá decretar seu impeachment, o terceiro no país neste século, e já enfrenta uma investigação sobre seus atos, incluindo pelo crime de traição. O ministro da Defesa, Kim Yong-hyun, apontado como um artífice do plano, renunciou ao posto e também será investigado. O Código Penal sul-coreano prevê que atos de alta traição podem receber a pena de morte, uma forma de punição que, embora ainda presente no sistema legal do país, não é aplicada desde 1997.

A turbulência em Seul, apontado como uma “democracia modelo” na Ásia, já havia sido notada pelos russos, que desde o início da invasão da Ucrânia têm se afastado da Coreia do Sul — hoje integrante da lista de “nações hostis” do Kremlin — e feito gestos na direção de Pyongyang, que incluem um acordo de defesa mútua, firmado em junho.

Desde 2022, o regime de Kim Jong-un tem enviado munições e foguetes para apoiar o esforço de guerra russo, em uma relação que agora inclui, além de armas pesadas, o emprego de tropas norte-coreanas no front. Em troca, Moscou cedeu, de acordo com informações de agências de inteligência, armamentos, alimentos, commodities, moeda estrangeira e tecnologia em setores como o aeroespacial e supostamente nuclear.

Na entrevista desta quinta-feira, Zakharova justificou o investimento em segurança feito pela Coreia do Norte, e lançou novos ataques não apenas a Seul, mas também aos EUA.

— O incidente que ocorreu em Seul mostra que a Coreia é a fonte de tensão e instabilidade na Península Coreana. Ao mesmo tempo, os Estados Unidos estão usando a Coreia para desestabilizar toda a região — disse Zakharova. — Garantir a segurança da Coreia do Norte é muito importante.

Na véspera, na primeira declaração vinda de Moscou sobre a crise em Seul, Zakharova disse que seu governo estava “observando com preocupação os trágicos eventos” no país, e concluiu que “a situação na Península Coreana já era suficientemente complicada por causa das provocações dos Estados Unidos da América e seus aliados”.

Também nesta quinta-feira, o vice-chanceler russo, Sergei Ryabkov, se encontrou com o embaixador sul-coreano na Rússia, Lee Do-hoon, com quem discutiu “a agenda internacional, incluindo a situação na Península Coreana”, informou o Ministério das Relações Exteriores, em comunicado, sem dar maiores detalhes.

Fonte: O Globo

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