Assembleia da ONU terá início em meio a divisões crescentes, ausências de lideranças e demandas do Sul Global

Visão geral da reunião da Assembleia Geral da ONU na sede das Nações Unidas em Nova York

A guerra na Ucrânia, a luta contra as mudanças climáticas e o apoio aos países do chamado “Sul Global” serão temas frequentes nesta semana na 78ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York. A grande reunião anual das nações será caracterizada tanto pelas suas presenças — além do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky comparecerá presencialmente para reunir apoio contra a invasão russa —, como pelas ausências de lideranças de países importantes como a China, Rússia, Reino Unido e França.

 

O encontro deste ano foi planejado levando em consideração as crescentes demandas das nações do “Sul Global”, grupo informal de países em desenvolvimento e subdesenvolvidos. Diplomatas afirmam que esses países têm se sentido frustrados pela atenção global voltada para o conflito na Ucrânia, enquanto suas próprias crises têm recebido pouca atenção e financiamento.

Em resposta a essas demandas, a ONU agendou discussões sobre mudanças climáticas, alívio da dívida soberana e maneiras de ajudar países em dificuldades a alcançar os objetivos de desenvolvimento da ONU em termos de prosperidade, saúde, desenvolvimento, educação e igualdade de gênero.

— Estaremos nos reunindo em um momento em que a Humanidade enfrenta grandes desafios, desde a piora da emergência climática até conflitos em escalada, a crise global de custo de vida, crescentes desigualdades e perturbações tecnológicas dramáticas — disse António Guterres, secretário-geral da ONU, a jornalistas na semana passada. — As pessoas estão procurando em seus líderes uma saída dessa confusão.

 

Guterres reconheceu, no entanto, que está se tornando cada vez mais difícil reunir os Estados-membros da ONU, dada a profundidade das divisões que foram enfatizadas com a ausência dos líderes mundiais no fórum.

 

O único líder de um membro permanente do Conselho de Segurança da ONU que participará da Assembleia será o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden. O presidente Vladimir Putin, da Rússia, e o presidente Xi Jinping, da China, não participarão do evento pelo segundo ano consecutivo. Entretanto, mais surpreendentes serão as ausências do presidente Emmanuel Macron, da França, do primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, e do primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi.

 

A missão da França na ONU informou que o presidente Macron teve um conflito de agenda devido à hospedagem do rei Charles III do Reino Unido em Paris esta semana. Por sua vez, o Reino Unido não forneceu uma resposta clara sobre por que o primeiro-ministro Sunak ficará de fora de sua primeira Assembleia Geral. Ambos os países serão representados por uma delegação de ministros, assim como a China.

Analistas afirmam que as ausências podem enfraquecer a instituição quando ela já está lutando para se manter relevante. As várias agências da ONU ainda estão na vanguarda da organização e fornecimento de ajuda humanitária. No entanto, à medida que a guerra na Ucrânia continua e uma série vertiginosa de golpes militares derruba governos de costa a costa na África, o papel da ONU como negociador e mediador foi marginalizado na maior parte do tempo.

 

A intervenção mais aguardada, por sua vez, é a de Zelensky — possivelmente sentando-se à mesma mesa com o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, caso ambos permaneçam em seus lugares enquanto o outro fala. Esta será a primeira vez que o chefe de Estado ucraniano comparecerá pessoalmente na sede da ONU desde o início da guerra em fevereiro de 2022 (no ano passado ele participou por videoconferência) e ocorre em um momento em que suas forças estão tentando acelerar o ritmo de sua contraofensiva para recuperar territórios ocupados pela Rússia.

Espera-se que Zelensky tente persuadir países que estão indecisos a apoiar Kiev na guerra. Ele também deverá refutar o crescente coro — entre alguns conservadores nos Estados Unidos, bem como lideranças em alguns países do Sul global, como Lula — dos que pedem negociações imediatas de paz para encerrar a guerra. O presidente ucraniano também deve participar de reuniões bilaterais com líderes, incluindo Lula, na quarta-feira, e de uma reunião do Conselho de Segurança da ONU sobre a guerra.

 

A jornada do líder ucraniano pelos EUA continuará na quinta-feira, em Washington, onde se encontrará com Biden na Casa Branca — será a segunda conversa na residência presidencial em nove meses — e irá ao Capitólio para encontros com parlamentares americanos. Lá, Zelensky buscará fortalecer o apoio ao seu governo, pois aguarda a aprovação de um novo pacote de assistência militar e humanitária dos Estados Unidos.

 

As reuniões também se concentrarão em questões como mudança climática, financiamento para o desenvolvimento e água.

 

Após negociações complicadas, os líderes globais planejam adotar uma declaração política sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, a fim de revitalizar as 17 metas adotadas em 2015 para combater a pobreza e a desigualdade — que, devido a causas como a pandemia de Covid-19, o conflito na Ucrânia, o aumento do autoritarismo e a falta de interesse dos governos, estagnaram ou regrediram, como no caso da segurança alimentar.

Até 2030, a data em que as metas deveriam ser alcançadas, estima-se que 500 milhões de pessoas ainda viverão em extrema pobreza, e 100 milhões de crianças não terão acesso à educação. Dos que frequentam a escola, 300 milhões sairão sem saber ler ou escrever.

 

 

Além disso, os países também abordarão questões como a reforma das instituições multilaterais e da própria ONU, em um contexto em que a rivalidade entre os Estados Unidos, a grande potência mundial, e a China, a grande potência emergente, está caminhando para o que parece ser uma nova bipolaridade global.

A ausência de seus principais rivais globais, Pequim e Moscou, abre uma oportunidade para os Estados Unidos nesta ocasião, permitindo que eles se apresentem como defensores da ONU e de tudo o que ela representa.

Segundo o conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Jake Sullivan, na participação de Biden na Assembleia Geral, o presidente “reafirmará e defenderá os princípios fundamentais da nossa ordem internacional, incluindo a Carta das Nações Unidas e a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Ele também enfatizará a necessidade de que a ONU e as instituições multilaterais sejam mais representativas, democráticas e eficazes”. (Com El País e New York Times.)

Fonte: O Globo