Temperatura alta e clima seco estão afetando a dinâmica das florestas tropicais

Temperaturas elevadas e o clima mais seco que vêm sendo registrados com maior frequência nos últimos anos em vários países estão afetando a dinâmica das florestas tropicais, como Amazônia e Mata Atlântica. Sob essas condições climáticas, as árvores morrem mais rapidamente.

Em biomas nos trópicos elas já crescem, em média, duas vezes mais rápido do que as de florestas temperadas e boreais e vivem menos – 186 anos, em média, contra 322 anos, respectivamente. As florestas tropicais úmidas abrigam cerca de 50% das espécies de animais terrestres e plantas do planeta, apesar de representarem apenas 7% da área terrestre mundial.

Como a previsão é de que a temperatura global continue subindo – ao menos 1,5 graus acima do nível pré-industrial (1850-1900) nas próximas décadas –, isso pode provocar mudanças nas características de cada um desses biomas tropicais, resultando, no futuro, em alterações da biodiversidade e diminuição do número de espécies.

Também deve afetar o papel que essas árvores desempenham nos estoques de carbono (CO2), levantando preocupações em relação à capacidade de absorção desse gás de efeito estufa no futuro. As florestas são o maior reservatório de biomassa terrestre, principalmente as tropicais, responsáveis pela metade desse estoque.

Para se desenvolverem, as plantas precisam de uma grande quantidade de CO2 na fase de crescimento. Com isso, acabam processando por meio da fotossíntese cerca de um quinto do total anual do carbono atmosférico. Assim, pequenas mudanças no funcionamento da floresta podem alterar significativamente os níveis desse gás.

Esse cenário de redução da longevidade ligada a efeitos climáticos em biomas tropicais está traçado em estudo liderado por pesquisadores brasileiros e publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), da Academia Norte-Americana de Ciências.

De acordo com a pesquisa, “nas planícies tropicais quentes foram encontradas diminuições consistentes na longevidade das árvores em locais secos e com temperaturas médias anuais acima de 25,4 graus”.

“Observamos no estudo que, quando a temperatura média passa dos 25,4 graus, a taxa de crescimento está num pico, em patamar alto, e a longevidade diminui. É um efeito além do esperado pela relação negativa entre crescimento e longevidade das árvores. Mas também está ligado à disponibilidade hídrica. Quando o local seca, cria um estresse na planta. Então ela atinge tamanhos menores e morre mais jovem, mesmo sendo uma espécie que poderia ficar maior”, explica à Agência FAPESP Giuliano Locosselli, atualmente pesquisador do Instituto de Botânica. Ele é primeiro autor juntamente com Marcos Buckeridge, professor e diretor do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP), que resultou de um projeto de pesquisa apoiado pela FAPESP.

Locosselli também foi um dos autores de outra pesquisa, publicada recentemente na revista Nature Communications, que já havia apontado relação inversa entre a taxa de crescimento das árvores e a longevidade, independentemente da espécie e do local onde se encontram (leia mais em: https://agencia.fapesp.br/34444/). Agora, o novo estudo coloca lupa sobre o comportamento em florestas tropicais e aponta o papel do clima e da disponibilidade hídrica nesses quadros.

Ao ser questionado sobre como ficariam essas árvores diante de estimativas de agências ligadas às Nações Unidas (ONU) de que a temperatura média da Terra pode subir mais de 1,5 graus até 2050, Buckeridge afirma que a forma de evitar um cenário pior para os biomas seria bloquear o aquecimento global.

Porém, ele lembra que há o fenômeno da inércia, ou seja, mesmo se agora fossem suspensas todas as emissões de gases de efeito estufa que provocam o aquecimento, a temperatura ainda assim manteria a tendência de alta por um período. “Acho que o cenário dos 25,4 graus [utilizado no estudo] não tem mais como reverter. No ponto em que estamos é preciso trabalhar com medidas de mitigação das mudanças climáticas e de adaptação, como plantar novas árvores”, avalia o professor, que participou como autor no relatório especial Mundo em Aquecimento de 1,5 graus, do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), da ONU.

Já Locosselli cita o caso da floresta do Congo, a segunda maior tropical do mundo, só atrás da Amazônia. “Atualmente ela ainda não é afetada pelo efeito da temperatura, como já se viu na região amazônica. Mas, a partir desse grande aumento de temperatura, começaremos a observar sinais de elevação da mortalidade. Isso vai ao encontro do que vimos no nosso estudo. Sob esse ponto de vista, o cenário é bastante sombrio”, completa.

Documento divulgado pela Organização Meteorológica Mundial (WMO, na sigla em inglês) apontou que a temperatura média global entre 2016 e 2020 (de janeiro a julho) está entre as mais quentes do que qualquer outro período. Atualmente, é estimada em 1,1 graus acima da era pré-industrial e 0,24 graus mais quente do que a média global para 2011-2015. Além disso, dados das agências norte-americanas Nasa e National Oceanographic and Atmospheric Administration (NOAA) apontaram os anos de 2016 e 2019 como o primeiro e o segundo mais quentes de todos os tempos, respectivamente.